Accessibility Tools
Por Milene Gabriela
No ano de 1975, a Organização das Nações Unidas assumiu oficialmente o 8 de março como dia Internacional da Mulher, reconhecendo uma série de
mobilizações por direitos que as mulheres vinham construindo ao redor do mundo desde o início do século XX. Entre os eventos mais marcantes dessa longa luta estão o incêndio na fábrica de roupas Triangle Shirtwaist, em Nova York, em 1911 — que revelou as péssimas condições de trabalho a que as mulheres eram submetidas — e a marcha das mulheres russas por pão e paz, em 1917.
Mais de um século depois dessas manifestações históricas — e de tantas outras que se seguiram a elas —, as mulheres ampliaram seus espaços na sociedade, mas ainda lutam por direitos básicos. Embora elas sejam maioria em várias esferas — como entre os estudantes e técnicos da UFRJ —, as mulheres ainda convivem com o status de “minoria”. Vice-presidente da AdUFRJ, a professora e cientista política Mayra Goulart avalia que esse status é mais uma faceta de opressão. “As mulheres são uma minoria não demográfica, ou seja, uma população que, embora grande, é sub-representada na sociedade por questão de opressão simbólica e econômica. A mulher só vai deixar de ser uma minoria não demográfica quando essa estrutura patriarcal que nos oprime for transformada”, diz ela.
Mayra considera importante a luta por direitos: “Nós nos lembramos da nossa responsabilidade de lutar não só por nós, mas por todas as outras, aquelas que não têm força e aquelas que não podem. A luta é sempre coletiva”.
Ainda é preciso avançar para garantir a entrada de mais mulheres em posições de liderança na estrutura administrativa das universidades. Em 102 anos, Denise Pires de Carvalho foi a primeira mulher a ocupar o cargo de reitora da UFRJ. Luzia Araujo, ouvidora-geral e ouvidora da Mulher da UFRJ, acredita que ter uma reitora mulher estimula que mais mulheres ocupem cargos de liderança. “Devemos lutar ainda mais para que se abram mais espaços para nós, a fim de que tenhamos mais oportunidades ao longo de nossas carreiras”, defende Luzia.
A ouvidora frisa a necessidade de que se intensifique o comprometimento da UFRJ com a diversidade, a equidade e a inclusão. “É preciso que se desenvolva uma política que garanta a admissão de servidoras mulheres na universidade, para todos os cargos e, especialmente, para docentes, já que ainda somos a minoria,” comenta Luzia. “É necessário, ainda, a promoção de capacitação permanente de todas as mulheres e a sua introdução em atividades que envolvam a tomada de decisão e o gerenciamento junto à sua equipe”, completa.
MULHER NA CIÊNCIA
Ainda é longa a luta por mudanças de paradigmas na Ciência e no meio científico. Sabrina Baptista, professora e pesquisadora do Instituto de Química de Química
da UFRJ, diz que, mesmo em 2023, as mulheres ainda precisam lidar com o preconceito de homens na profissão. “A mulher na Ciência não quer nenhum privilégio, ela quer condições em que consiga trabalhar e crescer profissionalmente”, opina.
A pesquisadora é embaixadora do projeto “Parent In Science” na UFRJ e conta que já recebeu olhares atravessados quando falava sobre maternidade e sobre equidade de gênero. “Nas duas vezes que engravidei fui questionada por estar começando a carreira e já ter engravidado. Escutei que ter filhos estragaria a minha carreira profissional”, recorda.
Sabrina acredita que ainda falta reconhecimento às mulheres e que há um longo caminho para que elas não sofram discriminação ao ocupar cargos. “Desejo que a gente termine um dia sem ser atravessada em uma fala, que a gente não seja interrompida ou assediada”, diz a professora. “Melhorou muito, se comparado com os anos anteriores, mas ainda precisamos melhorar em escala mundial”.
DEPOIMENTOS
Natália Trindade,
estudante e presidenta da APG
Quando entrei na graduação, em 2008, a maioria da sala era de mulheres; os docentes, homens brancos e heteros. As questões de gênero e LGBT não eram discutidas em sala de aula. E havia uma necessidade de ser viril, de não demonstrar emoções e nem afeto por pessoas do mesmo sexo, pois iria te comprometer profissionalmente. Houve um avanço, mas ser mulher negra no movimento estudantil e na APG são desafios semelhantes. Vivi situações em que as pessoas, sejam progressistas ou conservadoras, queriam resolver coisas com um homem, não com uma mulher, sempre numa perspectiva de que somos difíceis de lidar e emotivas. Estou construindo uma carreira na academia e na política, e tenho que ter atenção na forma com que me comunico, porque tenho mais chances de ser má interpretada, e toda minha biografia virar pó. Para ocupar mais espaços de poder, as mulheres precisam de recursos e condições. Só com as mulheres ocupando o espaço da política os debates vão ser feitos, e com pessoas pretas também. (Igor Vieira)
Luciana Marta dos Santos,
secretária-executiva
Gosto de trabalhar na universidade, não sou discriminada aqui. Sou respeitada por mulheres e por homens. Se eu fosse um homem, um gestor, eu olharia o profissional, não o gênero. O que seria dos homens se não tivessem as mulheres? A cobrança é muito mais em cima da mulher, não só na questão profissional, em tudo: como você se veste, como você fala e como se dirige a alguém. Ter mulheres nesse espaço influenciou que eu estivesse aqui hoje. A mulher na universidade está tendo mais destaque, a gente está evoluindo. A sociedade ainda é preconceituosa e até a gente mesmo é: não vemos uma mulher que conserte ar-condicionado, muito difícil de encontrar. Algumas áreas profissionais ainda são mantidas por homens. O recado que deixo é nunca desistir do que a gente quer ser, seja o que for, na área profissional, na área pessoal, como filha, como mãe. Não desistir nunca dos seus sonhos, do que você acredita e que tudo é possível para todo mundo. (Miliene Gabriela)
Débora Foguel,
professora e pesquisadora
Fui mãe quando ainda estava na graduação em Biologia na UFRJ. Aprendi a organizar meu tempo para dar conta das exigências dos estudos, da maternidade e da casa. Tive suporte, em especial de minha família. Mas não é a realidade de todas. Eu não podia ir a eventos quando quisesse. Os pesquisadores homens e pais convidados a palestras e congressos respondem imediatamente “sim, eu posso”. Para as mães, isso requer a montagem de uma estratégia complexa em casa. Esse é apenas um pequeno exemplo. O dia a dia também é desafiador. Apesar dos avanços, falta suporte para as mães, inclusive na nossa comunidade. Por exemplo, vagas na creche, salas de amamentação e até uma rede de mulheres que se apoiem. Se uma professora está com o filho doente, quem sabe alguém da rede poderia substituí-la em sala de aula? Para as alunas, os avanços são ainda menores nos prazos e licença-maternidade. Mas o dia 8 de março nos trouxe muito alento com as medidas anunciadas pelo atual governo, até mesmo na área da pesquisa. (Igor Vieira)
Por Milene Gabriela e Silvana Sá
A cada seis horas uma mulher é assassinada no Brasil. O dado chocante foi apresentado no último relatório do Dieese sobre gênero. Elas também são o grupo mais desempregado e recebem menos pelas mesmas funções desempenhadas por homens.
Na UFRJ, as mulheres são maioria entre estudantes e técnicos-administrativos e represemtam 48% do corpo docente da universidade. As professoras ainda são minoria nas coordenações de programas de pós-graduação. Dos 132 existentes, elas comandam 60, ou 45,5% do total. Já os cargos de direção são 43% ocupados por mulheres. Os dados foram obtidos pela reportagem da AdUFRJ junto às pró-reitorias de Pessoal, de Graduação e de Pós-Graduação e Pesquisa.
Outro levantamento, junto ao CNPq, mostra que as pesquisadoras representam pouco mais de 35% do total. Entre as 1A, elas são apenas 27%. Veja a seguir os números que mostram a inserção das mulheres no mercado de trabalho e na academia.




Por Francisco Procópio
Cores, rostos, histórias e mulheres diversas se reuniram no Centro do Rio no dia 8 de Março para protestar por igualdade e em defesa da democracia. O 8M desse ano pediu a punição exemplar aos golpistas que atentaram contra o Estado Democrático no início do ano. Mas elas querem mais: saúde, educação e o direito de continuarem vivas. “Eu já fui muito violentada por homens e não quero que outras mulheres sofram isso”, revela Adriana Rodrigues de Souza, que vive em situação de rua e vende balas para sobreviver. “Por isso vim ao ato hoje. Sou totalmente contra a violência”.
Os corpos de mulheres negras são os mais impactados, de acordo com a deputada estadual Renata Souza (PSOL-RJ), que participou da passeata. A vereadora Marielle Franco, assassinada em 14 de março de 2018, foi uma das vítimas dessa face perversa da sociedade. O crime completa cinco anos na próxima semana sem que os mandantes tenham sido descobertos e punidos. “Existe uma misoginia e um racismo que opera contra os nossos corpos. Vivemos todos os dias situações de violência política de gênero”, disse. “O que aconteceu com Marielle foi feminicídio político. Esse é o nome”, afirmou a parlamentar. “Precisamos estranhar que não cheguemos a 3% de mulheres pretas em espaços de poder”, disse.
A diretoria da AdUFRJ também participou do ato. A professora Ana Lúcia Cunha Fernandes acredita na mobilização para sensibilizar a sociedade sobre as pautas das mulheres. “É importante estarmos aqui para chamar atenção da sociedade para a enorme necessidade que ainda existe de lutar por igualdade entre homens e mulheres. Muita coisa já avançou, mas ainda há um grande ataque às mulheres”.
Um enorme cordão de mães e crianças emocionou e mostrou que o feminismo é pedagógico, aprendido e ensinado desde cedo. “Eu exerço meu feminismo sendo mãe do meu filho e trazê-lo para as lutas das mulheres é uma das formas de ser feminista em todos os lugares. As mães ainda lutam muito para ter espaços na militância”, advertiu Lina Ramos.
Ex-presidente da AdUFRJ, a professora Eleonora Ziller resumiu com maestria o momento: “Nas ruas construímos uma nova sociedade. Este 8 de março tem um significado muito importante para todas nós: sobrevivemos, e iremos vencer.”
Fotos de Alessandro Costa



Compreender o tamanho do quadro de servidores do Executivo é um bom passo para refletir sobre a complexidade da atual campanha salarial. São 560.811 servidores ativos, 417.660 aposentados e 235.273 pensionistas que podem ser beneficiados pela recomposição dos salários.
“A dimensão da categoria sempre pesou contra nós. Sempre gerou tensão, porque os impactos dos reajustes são maiores”, explica a professora Eleonora Ziller, ex-presidente da AdUFRJ.
Desde 2015, há perdas acumuladas de 46,6% no funcionalismo federal. Entre os professores, a última parcela de reajuste aconteceu em 2019. Para esse grupo, as perdas desde então chegam a 32% entre os professores em início de carreira.
O índice de 26,94%, proposto pelos servidores no lançamento da campanha, em janeiro, reflete um percentual emergencial que agrupa apenas as perdas inflacionárias do governo Bolsonaro.
A reivindicação foi negada pelo governo em 16 de fevereiro. Na ocasião, o Ministério da Gestão apresentou a contraproposta de 7,8%, além do reajuste de 46% no vale-alimentação. O percentual, muito abaixo do desejado pelos servidores, foi rejeitado pelos sindicatos. O Fonacate – fórum que reúne as carreiras típicas de Estado –, no entanto, encaminhou ao governo uma nova proposta para apreciação: 13,5% de reajuste linear.
Com as propostas na mesa, o governo ganha tempo, ao adiar a reunião do dia 7. “Esta rodada era esperada com ansiedade por 1 milhão e 200 mil ativos e aposentados, e seus pensionistas. Vamos deliberar sobre um Dia Nacional de Protesto, afinal já são seis anos e dois meses de perdas acumuladas”, protesta o presidente do Fonacate, Rudinei Marques.
“Entendemos que o orçamento atual foi montado pelo governo anterior, que nos tratava como inimigos”, complementa a professora Mayra Goulart, vice-presidente da AdUFRJ. “Tendo isso em mente, valos lutar pelo maior percentual possível”, defende.
Para o presidente do Fonasefe, David Lobão, uma possível saída é utilizar verbas de contingenciamento para o reajuste salarial. Ele, no entanto, reconhece a dificuldade na campanha atual. “É verdade que se gastar toda a verba de contingenciamento com salários, o governo fica sem lastro para tratar de questões sociais emergenciais”, justifica. “De fato, é uma situação muito difícil. Ninguém quer colocar a faca no pescoço do governo, mas nos incomoda que esses índices não sejam colocados de imediato na mesa”, critica. (Colaboraram Igor Vieira e Milene Gabriela)
