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Alexandre Medeiros e Liz Mota Almeida
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O ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Pedro Hallal, e o pró-reitor de Extensão e Cultura, Eraldo dos Santos Pinheiro, assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Controladoria-Geral da União (CGU) por proferir “manifestação desrespeitosa e de desapreço direcionada ao presidente da República”, conforme consta em publicação no Diário Oficial da terça-feira (2). Pelo acordo, os professores ficam impedidos, por dois anos, de descumprir o artigo 117 da Lei nº 8112/1990, que proíbe os servidores públicos de “promover manifestação de apreço ou desapreço no recinto da repartição”.

Em 7 de janeiro, após Jair Bolsonaro nomear a segunda colocada na listra tríplice da UFPEL como reitora, o então reitor Pedro Hallal fez duras críticas ao presidente por atentar contra a autonomia universitária, durante transmissão ao vivo nos canais da universidade na internet. Segundo a CGU, o ambiente virtual da universidade se configura como “local de trabalho”, o que infringiria o artigo 117. O processo contra os docentes da UFPEL foi movido a partir de pedido do deputado federal bolsonarista Bibo Nunes (PSL-RS), que pleiteava a demissão de Pedro Hallal. Com a assinatura do TAC, que na prática impõe uma “mordaça” de dois anos aos professores, o processo foi arquivado.  

Doutor em Epidemiologia, Hallal é um dos mais ferrenhos críticos à condução do combate à pandemia de covid-19 pelo governo federal. Publicou um artigo na revista científica Lancet em que diz que três em cada quatro mortes pela doença poderiam ter sido evitadas no Brasil caso o governo não cometesse tantos erros. Em entrevista à revista Carta Capital na quarta-feira (3), Hallal disse que optou por assinar o TAC para que o processo fosse arquivado e associou o ataque que sofreu ao seu posicionamento quanto ao combate à covid-19: “Talvez não seja coincidência que eu sou um dos pesquisadores que mais têm feito críticas à atuação do governo durante a pandemia”.

Em 7 de fevereiro, um mês após as críticas de Hallal, o Ministério da Educação, por meio da Rede de Instituições Federais de Ensino Superior (Difes), encaminhou um ofício em que determinou às universidades a tomada de providências com objetivo de “prevenir e punir atos político-partidários nas instituições públicas federais de ensino”.   O ofício se baseou em uma recomendação de 2019 do Ministério Público Federal, assinada pelo procurador-chefe da República em Goiás, Ailton Benedito de Souza. Em maio de 2020, contudo, o Supremo Tribunal Federal decidiu por unanimidade que são inconstitucionais decisões judiciais que vedem a liberdade de expressão de alunos, professores e servidores em universidades. O ofício da Difes vai de encontro a essa decisão.

Na quarta-feira (3), líderes de seis partidos de oposição (PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB e Rede) encaminharam uma representação à Procutadoria-Geral da República contra “ato ilegal e imoral” do ministro da Educação, Milton Ribeiro, e do diretor da Difes, Eduardo Gomes Salgado, pelo envio do ofício. No documento, os parlamentares sustentam que os ataques às universidades públicas por parte do governo federal é contumaz: “A escalada autoritária em face da autonomia universitária está na ordem do dia do governo Bolsonaro, sobretudo por aqueles que hoje dirigem o Ministério da Educação”. Na representação, os partidos argumentam que o ofício deve ser considerado inconstitucional e exigem que os responsáveis sejam processados por improbidade administrativa.



CARTA ABERTA AO EXMO. SR. MINISTRO DA EDUCAÇÃO, MILTON RIBEIRO

Falo apenas e tão-somente como professor titular da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Não posso acreditar nas notícias veiculadas nos jornais de hoje sobre suposta decisão de seu ministério. Porque seria um flagrante desrespeito à Constituição de 1988, à liberdade de cátedra e de expressão. Uma inominável perseguição aos professores. Se a notícia for verdadeira, senhor ministro, trata-se de agressão à democracia. Diminui a estatura da pasta. E não só. Não pode ser um “ukaz” ou uma “fatwa”, senhor ministro. Vivemos sob a égide da Constituição Cidadã. Quero acreditar que tudo não passe de imenso, vergonhoso equívoco. Não posso assistir, de braços cruzados, à agressão contra meus colegas, contra a universidade brasileira. Abra a Divina Comédia e o senhor verá dentro dela mística pura, política intensa, seria o caso de abrir processo contra Dante, se vivo estivesse.Não ouso acreditar no que li. Seria o começo do Apocalipse. Uma agressão aos democratas.

Marco Lucchesi
Professor Titular de Literatura Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro

*Lucchesi também é presidente da Academia Brasileira de Letras

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