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Elisa Monteiro


“Agora mesmo um repórter do Le Monde me perguntou se eu queria falar para uma reportagem grande sobre o Augusto Heleno (general da reserva e chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República). Imagina se a gente poderia pensar em uma coisa dessas? Um general brasileiro dando perfil na imprensa internacional”, disse João Roberto Martins Filho, Professor Titular Sênior do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos. O docente foi um dos convidados do segundo encontro do ciclo “Dos tanques ao Twitter: militares e política”, promovido pela Comissão da Memória e Verdade da UFRJ no dia 20.
O título do ciclo é uma referência à manifestação política de outro general da reserva, Eduardo Villas Bôas na rede social, em abril de 2018, contra o habeas corpus do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal. À época, o habeas corpus foi negado e o petista permaneceu preso.

Autor do livro Os militares e a crise brasileira, João Roberto descartou a possibilidade de cisões dentro das Forças Armadas para 2022. “Não adianta achar que vão apoiar um governo de esquerda democrática. Eles não vão fazer isso”, afirmou. O motivo está no que o pesquisador chama de “geração de generais bolsonaristas”, cujo antiesquerdismo funciona como “cimento ideológico”.  

Entre os nomes mais reconhecidos hoje, João Roberto cita Hamilton Mourão, Eduardo Villas Bôas, Augusto Heleno, Santos Cruz e Sérgio Etchegoyen. “Com exceção do Heleno, todos eles se formaram entre 1974 e 1976, viveram o período militar, com a memória recente da luta armada. De certa maneira, eles formam a geração dos anos setenta dos generais bolsonaristas”, argumentou o docente da UFSCar.

Por outro lado, o calcanhar de Aquiles do grupo, para 2022, está no caminho escolhido para voltar ao centro do Estado em 2018: eleições legitimadas pelo voto popular. “Eles apostaram que era possível jogar o Brasil para a direita por eleições. Agora, como eles vão contrariar a vontade popular, se ela jogar o Brasil de novo para o campo democrático?”, questionou.

Fogo amigo
O debate contou ainda com a vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, Nadine Borges. “Logo que concluímos o relatório da Comissão Nacional da Verdade, Etchegoyen entrou com uma ação judicial pedindo para retirar o nome do tio-avô dele, que constava como torturador”, relatou a representante da OAB. “É falsa a ideia de que contribuíram com a Comissão Nacional da Verdade. Eles atrapalharam no que puderam”.

 A advogada condenou a conivência dos poderes civis, como o Executivo e o Judiciário, em relação aos agentes de Estado que praticaram crimes típicos de ditaduras, como tortura, sequestros, estupros, mortes e ocultação de cadáver, na justiça de transição brasileira. “Foi uma justiça de transação, foi tudo negociado”, ela diz. “Desde a redemocratização, sem exceção, todos os governos se omitiram, de fato, de exigir respostas das Forças Armadas sobre o que aconteceu na ditadura militar neste país”.
A impunidade, segundo Nadine, manteve muitos desses militares não só na ativa como trabalhando nos sucessivos governos. Novamente, Etchegoyen serviu de exemplo para Nadine: “Ele foi responsável por montar o Gabinete de Segurança Institucional, isto é, toda a inteligência do governo Michel Temer. Ou seja, direto dos tanques ao twitter”.

Para a professora do Instituto de História, Maria Paula, o momento atual coloca à prova conceitos como “democratização” e “justiça de transição”. “Não há um ponto de chegada, um ponto final, a gente nunca chega a um ponto ótimo”, avaliou a docente. “As sociedades têm sempre a possibilidade e a capacidade de absorver novas demandas para a ampliação da democracia”.

Maria Paula e o colega José Sérgio Leite Lopes — também Titular e coordenador da Comissão da Memória e Verdade da UFRJ — compartilharam a mediação do evento virtual. O vídeo pode ser conferido na íntegra pelo canal do Fórum de Ciência e Cultura no Youtube.

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