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af9ec699 bdd5 4136 9298 0c5a7e95463aProfessora Tatiana Sampaio - Foto: Igor VieiraIgor Vieira

Uma pesquisa inovadora do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) conseguiu R$ 3 milhões para a UFRJ. A quantia representa um dos maiores investimentos já feitos por uma empresa na universidade. A farmacêutica nacional Cristália fez o investimento para o grupo coordenado pela professora Tatiana Sampaio completar os estudos sobre a polilaminina, uma droga capaz de reverter ou minimizar lesões na medula e recuperar movimentos do corpo em acidentados.
“Eles assinaram um contrato de cooperação, e sabiam que estavam entrando em um negócio com risco muito menor, pois a pesquisa já tinha passado pelo estudo clínico, que é o maior gargalo nestes casos”, explica a professora Tatiana Sampaio, em referência aos testes realizados com humanos.
Em tempos tão duros para a Ciência no país, o investimento é mais do que bem-vindo. A pesquisa, iniciada em 1998, contou com financiamentos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e bolsas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), mas sempre insuficientes. “O gasto do laboratório era de cerca de R$ 200 mil por ano”, diz a docente.
Graças ao apoio da farmacêutica, a pesquisa chegou à prova final. Antes de ser comercializada, a polilaminina deverá passar pela aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. “Coletamos os dados e vamos fazer o pedido para o teste padrão, que demora cerca de um ano para ser respondido”, adianta Tatiana.
O chamado teste piloto, realizado na universidade, com pacientes de diversos hospitais de emergência do estado — principalmente o Hospital Azevedo Lima, em Niterói, e o Hospital Souza Aguiar, no Rio — durou três anos. “Creio que, dessa vez, será mais rápido, pois cada paciente que recupera os movimentos é uma confirmação da eficácia da droga”, completa a pesquisadora.
Na Ciência, os prazos são dilatados por questões de segurança e verificação dos dados. Não à toa, Tatiana classifica o estudo da polilaminina como a “pesquisa de uma vida inteira”. De 1998 até 2004, o grupo focou apenas na molécula e na resposta celular; de 2004 até 2012, foram feitos os testes pré-clínicos em animais; em 2012, houve o pedido para o teste em humanos, que só começou em 2016. A Cristália entrou em cena em 2021 — o contrato de R$ 3 milhões foi assinado ano passado, mas a divulgação e o repasse só ocorreram agora. “Foi um ressarcimento pretérito e financiamento futuro”, afirma Tatiana.
O dinheiro estava com a Fundação Universitária José Bonifácio (FUJB), que analisou para onde iria cada parte, além de calcular os impostos e taxações: um terço para Tatiana e sua equipe; um terço para o ICB e um terço para a universidade.

ENGAJAMENTO
Quem também enxerga o trabalho com bastante orgulho é a bióloga Karla Menezes, que teve uma motivação pessoal para se engajar na pesquisa. “Eu me acidentei com 23 anos. Fraturei três vértebras lombares e fiquei com formigamento e sem sensibilidade em um acidente. Foi um milagre. Quebrei o pescoço em vários lugares, mas não tive dano neurológico”.
O acidente aconteceu oito meses antes da formatura no curso de Biologia, sua segunda graduação depois da Enfermagem. De imediato, decidiu que iria trabalhar com lesão medular e veio para o Rio de Janeiro para pesquisar com Tatiana Sampaio na UFRJ: “Sinto que nasci de novo. Foi uma imensa sorte”.
Karla se sentiu realizada com o segundo paciente do estudo clínico, um jovem de 23 anos — a mesma idade que ela tinha quando se acidentou — que ficaria tetraplégico, e já tinha desistido da vida. Com a injeção, ele retomou os movimentos.

AMBIENTE DE INOVAÇÃO
Pró-reitora de Pós-graduação e Pesquisa, a professora Denise Freire não tem dúvidas de que a política de inovação da universidade, instituída ano passado, facilitou o desfecho do trabalho da pesquisadora do ICB. A resolução nº 08/2021 trata de parcerias tecnológicas, licenciamentos, compartilhamento de instalações e prestação de serviços técnicos especializados — como a negociação do contrato com a farmacêutica, conduzida pela Agência de Inovação (agora Inova UFRJ) —, entre outros pontos. “Aprovamos a política de inovação no Consuni e agora estamos desenvolvendo regulamentações complementares, de modo a operacionalizar sua implementação”.
Na construção da política, o Parque Tecnológico, a incubadora de empresas, a incubadora social, a Agência UFRJ de Inovação (hoje Inova UFRJ) e os inovas dos Centros passaram a se articular mais. “Nossa premissa sempre foi trabalhar com o conceito abrangente de inovação, o que significa a incorporação de todas as áreas do saber, percorrendo diferentes tipos e funções possíveis que uma inovação pode trazer de benefício para a sociedade”, afirma Denise.
Para os próximos anos, a expectativa é por mais resultados. A Faperj aprovou o financiamento do Projeto Esteira de Inovação da UFRJ, que rendeu R$ 4 milhões para a articulação do ecossistema de inovação da universidade.
Ao olhar para trás, a professora Tatiana Sampaio comemora os resultados de tanto esforço. “Começar desde a molécula, enfrentar os desafios no caminho, com grandes mudanças e perdas, até o estudo clínico, é algo que ninguém fez, pois não era um caminho certo”. (colaborou Kelvin Melo)

DROGA PODE RESTAURAR MOVIMENTOS PERDIDOS

A equipe sintetizou em laboratório a polilaminina, um biofármaco capaz de recompor a estrutura original da laminina, proteína existente no corpo humano. O segundo passo foi achar uma função para a polilaminina e saber em que tipo de terapia ela poderia ser utilizada. O grupo descobriu que a droga era capaz de estimular a reconstrução espontânea da medula espinhal. Pela primeira vez, chegou-se a uma droga sintética capaz de estimular um processo natural que estava bloqueado.
Tatiana decidiu testar a droga em pacientes que sofreram lesões na medula, em acidentes de trânsito ou em quedas. A docente descobriu que a aplicação da polilaminina pode devolver o movimento perdido aos acidentados. Mas a administração do medicamento deve ser feita em um período de até três dias a partir do dano. O retorno da mobilidade pode ser parcial ou total, dependendo do grau da lesão.



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