Rodrigo S. Batalha, professor da Licenciatura em Música da UFRJ desde 2011
Desde o ano passado, cursos de licenciatura lidam com a reorganização curricular das novas Diretrizes do CNE para uma carga horária total de 3.200 horas. Cabe a cada Unidade coordenadora de curso a responsabilidade primária pela reforma, com 1.600 horas do Núcleo de conhecimentos na área e pedagógicos específicos, além de 320 horas do Núcleo de formação em extensão em escolas, ofertado pela própria, mas também por outras Unidades acadêmicas.
Na UFRJ, há dois gargalos a serem enfrentados no projeto em construção. O primeiro é a ampliação do Núcleo comum a todas as licenciaturas, de 880 horas. A Faculdade de Educação, historicamente responsável por essa formação geral, responderia por pouco mais da metade da carga horária, deixando para as Unidades coordenadoras das quase 30 licenciaturas suprirem o restante. O segundo diz respeito ao novo Núcleo de estágio supervisionado de 400 horas ao longo do curso, com início no primeiro período. A Faculdade de Educação se propõe a assumir integralmente esta oferta, mas como não dispõe de docentes orientadores suficientes em todas as áreas, admitiria contar com orientadores de áreas distintas e orientação específica por dois a três períodos da graduação apenas.
Qual seria o impacto disso na excelência acadêmica, nas condições de trabalho e na nota dos cursos justo quando o ENADE passou a avaliar as aulas ministradas por estagiários em campo? No final, o problema todo parece ser um: realocar docentes de áreas estranhas ao curso para tentar cobrir todos os estágios ao custo de ofertar menos carga horária do Núcleo comum. Ainda que boa sob algum ângulo, a alternativa não demonstra respaldo tanto nas Diretrizes, que tratam da articulação entre práticas de ensino e o Núcleo específico (Res. CNE 4/2024, Art. 13, §3º, IV), quanto na Lei Federal de Estágio (2008), que exige orientadores “da área a ser desenvolvida no estágio” (Art. 7º, III). Sobretudo, um programa de estágio genérico, entregue ‘finalizado’ à revelia para cada Unidade coordenadora de curso, sem a construção de um diálogo, inclusive sem ouvir os estudantes estagiários do presente, nasce de uma premissa anacrônica que espelha o tempo em que a licenciatura era um curso complementar aos bacharelados e tudo referente a ela, inclusive o estágio, se concentrava na mesma Unidade, a FE. No século XXI, essa exclusividade na concepção dos estágios deixa de considerar que as Unidades coordenadoras de licenciaturas dispõem de quadros especializados para também conceber e ofertar o estágio do curso que coordenam; e que o Colégio de Aplicação é Unidade central à proposta de estágio de cada curso, vide o Estatuto da UFRJ. Talvez esteja aí a raiz da questão: permitir maior participação democrática.
O momento exige mobilização da comunidade universitária e pode representar a oportunidade de um novo pacto institucional que reafirme a preparação de professores como prioridade da UFRJ (na COTAV em especial) e fortaleça o nosso vínculo com a educação básica. Somando-se ao papel da FE no Núcleo comum, imaginem, com as devidas condições e a articulação da Comissão Permanente de Licenciatura do CEG e do Complexo de Formação de Professores, se a Faculdade de Letras ofertasse disciplina e projeto de literatura para todas as licenciaturas: uma geração de professores leitores e uma nova circulação da literatura brasileira; o mesmo com as Escolas de Música, Belas Artes, Educação Física e Comunicação, em ofertas que impulsionassem repertórios culturais e artísticos na formação comum, e os Museus e outras Unidades acadêmicas nos diferentes campos de conhecimento, inclusive na prevenção ao negacionismo científico a partir da educação, e também em ofertas do NEABI para uma efetiva formação docente antirracista. Esta é a Universidade que (potencialmente) temos.




