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Ana Beatriz Magno e Lucas Abreu
Nelson Teich foi empossado ministro da Saúde nesta sexta (17) - Foto: Marcello Casal Jr/Agência BrasilProfessores do grupo especial de combate ao coronavírus da UFRJ avaliam a nomeação do novo ministro da Saúde, Nelson Luiz Sperle Teich. “Precisamos esperar para ver como ele vai chegar. Se ele entra agachado ou altivo para chefiar o Ministério”, pondera a professora Ligia Bahia, médica e uma das maiores especialistas do Brasil em Saúde Coletiva. “A questão é que ele não tem nenhuma experiência em saúde pública . Nunca pisou no SUS”.
Anunciado na tarde de quinta-feira para substituir Luiz Henrique Mandetta, o oncologista formado na Uerj é um “bem-sucedido” empresário do ramo de tecnologia hospitalar, dono da Teich Health Care, consultoria de serviços médicos.
Ele assume o comando do combate ao coronavírus justamente na semana em que a pandemia começa a explodir no Brasil. “Ele entra como um timoneiro que chega quando o Titanic já está afundando”, afirma Lígia.
O novo ministro tem 62 anos, não é político, mas participou da equipe que montou o plano de governo de Bolsonaro. Ele entra em cena numa feroz disputa política entre a visão pró-isolamento de Mandetta contra as posições anticientíficas do presidente Bolsonaro que, desde o início da pandemia, defende que a doença é apenas uma gripezinha e que a normalidade deve voltar para a economia se restabelecer .
“Teich não é a favor do isolamento vertical. Ele não é um terraplanista, não podemos ser sectários nem fulanizar a questão. Mas nós, defensores do SUS e da saúde pública, não descansaremos na vigilância. Não bato panela por Mandetta, um politico do DEM, nem aplaudo Teich previamente. Quero ver antes”, resume a docente da UFRJ.
“Nem ele nem Mandetta jamais foram defensores do SUS. Mas agora ele vai ter que defender. Só o SUS tem a magnitude necessária para atuar na pandemia”, resume a médica e reitora da UFRJ, professora Denise Pires de Carvalho. “A UFRJ espera que o ministro respeite o SUS, a Ciência e os hospitais universitários, como elementos estratégicos de combate à epidemia”, completa.
DEPOIMENTO
Alberto Chebabo - Diretor da Divisão Médica do hospital universitário
Alberto Chebabo“Temos de esperar para ver o que vai acontecer. Estávamos no caminho certo com o grupo do Mandetta, Wanderson e demais membros da equipe. Nós concordamos coma necessidade das medidas de distanciamento social. Existiram problemas? Sim. A gente não tem a capacidade de teste, por exemplo, mas não por culpa deste ou de outro ministro, mas porque a política para a pandemia deveria ter sido implementada antes da crise, não investimos no momento certo. Mas a condução da epidemia estava dentro do que a Ciência recomenda, dentro do que mostram as evidências científicas. O Brasil tem uma grande vantagem, que é a de estar atrás em relação ao resto dos países. Então podemos aproveitar e ver o que aconteceu em outros países, o que deu certo , o que deu errado, para tomarmos decisões aqui.
Conheci o Nelson Teich há muitos anos. É uma pessoa muito inteligente, muito preparada. Ele nunca trabalhou na área pública, mas isso pode não ser um problema. Vai depender da equipe que ele montar, técnica, preparada. Já tivemos políticos no ministério que souberam montar sua equipe e fizeram uma grande gestão, e médicos do SUS que não souberam. Teich é um excelente gestor.
O grande problema é que quem sai, sai parecendo o perdedor, e é justamente o lado que estava tomando as ações corretas. A população pode interpretar isso como um sinal de que ele não estava certo, e sim o presidente. É importante que o Nelson tome uma decisão imediata de apoio ao isolamento social.”
Reunião virtual do Conselho de Representantes“Fico imaginando que um Paulo Freire faria, hoje, coisas incríveis com essas tecnologias”, disse a pró-reitora de Extensão, professora Ivana Bentes, ao Conselho de Representantes da AdUFRJ. A dirigente foi a convidada especial do encontro virtual realizado no dia 6 e prestou esclarecimentos sobre as ações não presenciais da área em tempos de pandemia.
A professora fez questão de separar as atividades virtuais realizadas pela UFRJ de qualquer tentativa de imposição do Ministério da Educação a professores e alunos em relação ao EAD. Deixou claro que ninguém é obrigado a manter ações de extensão neste período, mas que também era necessário dar resposta a novas propostas, muitas criadas em função da própria pandemia. “Não vamos fazer essa discussão do ponto de vista do MEC, de escolão virtual. Os nossos valores são os da universidade pública. Vamos avançar”, disse.
Todas as novas ações, após aprovação dos diretores/coordenadores de extensão das unidades devem passar pelo crivo das congregações em sessão virtual. Em caso de excepcionalidade, poderá haver a aprovação “ad referendum” das direções de unidades.
Além disso, a professora informou que a universidade já contava com 23 cursos de ensino a distância programados para este ano, como o de formação continuada de servidores públicos. O programa ofereceu mais de sete mil vagas nos últimos três anos.
DEBATE
A apresentação dividiu opiniões. O professor Herli Menezes, da Faculdade de Educação, argumentou que discutir ensino a distância não é o melhor a se fazer em um momento de exceção. Chamou atenção para as imensas desigualdades brasileiras e seu reflexo nas condições de acesso às novas tecnologias: “Temos alunos que não têm smartphone com banda suficiente para dar suporte a essas atividades. Temos de tratar a questão politicamente”, disse.
Já o professor João de Mello Neto, do Instituto de Física, observou que o contato com os alunos e com a sociedade é “fundamental”. E mostrou apoio às atividades virtuais que os colegas têm condições de levar adiante, com a concordância dos alunos. “Nós vamos aprender a fazer várias coisas que não sabíamos. É muito melhor que o imobilismo”, afirmou.
“A reunião do Conselho foi muito esclarecedora. A professora Ivana Bentes deu um bom panorama da Extensão na UFRJ em tempos de Covid-19”, avaliou o professor Felipe Rosa, diretor da AdUFRJ. Para ele, o debate com posições consideravelmente divergentes sobre o tema foi positivo: “É ótimo porque mostra que, num tema complexo como o EaD e o uso das plataformas digitais, o debate está vivo. Algo essencial para a universidade, mesmo em tempos de pandemia”.
Presidente da AdUFRJ, a professora Eleonora Ziller observou que no caso das universidades, a única posição a esse respeito é garantir a autonomia universitária. “Temos que nos contrapor a qualquer tentativa de imposição do governo em relação ao EaD, mas também precisamos ser coerentes e não querer proibir outros tipos de atividade remota que venham a ser desenvolvidas na universidade”. E elogiou a apresentação da pró-reitora: “Esse é o momento de a extensão atuar. Como vamos construir, num momento como esse, as tão necessárias vias de mão dupla com a sociedade?”, questionou.
ENCAMINHAMENTOS
O Conselho referendou a nota do Colégio de Aplicação, crítico à decisão do MEC de manter o calendário do Enem deste ano. Também decidiu fazer uma nova solicitação de pleno funcionamento dos colegiados — de forma virtual — para o andamentos dos processos de progressão e de estágio probatório. Neste sentido, foi solicitado aos conselheiros da AdUFRJ que informem como está a situação destas instâncias em suas respectivas unidades.
O próximo CR está marcado para segunda-feira, dia 13. Será feito convite à professora Esther Dweck, do Instituto de Economia, para uma exposição sobre as medidas em curso no país.
Deputados federais discutem o aumento do percentual de insalubridade para os servidores que atuam atendendo pacientes com Covid-19. O PL 774/20 estende o percentual de 40% de insalubridade – máximo previsto – para profissionais da saúde da União, estados e municípios. O projeto é do deputado federal José Ricardo (PT-AM). No último dia 7, foi requerida a tramitação em regime de urgência.
Apesar da movimentação do Congresso, a Instrução Normativa nº 28, do Ministério da Economia, editada dia 25 de março, orienta o corte dos adicionais ocupacionais e auxílio-transporte nos contracheques dos servidores que estão trabalhando remotamente durante a pandemia. Para discutir o assunto, as diretorias da AdUFRJ e do Sintufrj se reuniram com suas assessorias jurídicas e a administração central da universidade. O encontro foi realizado por videoconferência, na quinta-feira (2).
A preocupação dos sindicatos e da reitoria é, principalmente, com o corte dos adicionais de insalubridade e periculosidade. Diretora do Sintufrj, a enfermeira Gerly Miceli lembrou que os efeitos dos materiais insalubres continuam mesmo sem que a pessoa esteja exposta. “Trata-se de uma indenização por anos de trabalho e exposição a substâncias tóxicas. Os efeitos se acumulam no organismo e permanecem”, disse.
A reitora Denise Pires de Carvalho acrescentou que a universidade só suspendeu as atividades acadêmicas. E optou por teletrabalho apenas para setores administrativos. “Atividades de pesquisa e assistenciais, nos hospitais, não pararam. Ao contrário. Estamos trabalhando como nunca, nesta pandemia. E é justamente onde se concentra o maior conjunto de profissionais que fazem jus à insalubridade”, justificou.
Na terça-feira, dia 7, o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Gestão de Pessoas das instituições federais de ensino superior (Forgepe) solicitou ao Ministério da Economia a revogação do artigo que suspende o pagamento dos adicionais ocupacionais. O Forgepe argumenta que a legislação prevê a manutenção dos valores mesmo quando os servidores estão ausentes de suas atividades presenciais. E cita situações como férias ou licença para tratamento da própria saúde. Os pró-reitores de Pessoal equiparam o contexto da pandemia com este segundo cenário. “O servidor em trabalho remoto ou afastado de suas atividades presenciais está em isolamento, compulsoriamente, em virtude de preservar a sua saúde”, diz um trecho do ofício do Forgepe.
Para os sindicatos, a medida é injusta, pois penaliza os trabalhadores num momento de crise global. Além de não se justificar, já que a maior parte dos profissionais que fazem jus ao benefício está trabalhando presencialmente. “Sabemos que não há um impacto financeiro que justifique esta ação. É mais um ataque aos servidores. Nossa intenção é construirmos um mecanismo de defesa coletiva”, afirmou Neuza Luzia, coordenadora-geral do Sintufrj.
De acordo com o texto, servidores afastados do trabalho presencial terão suspensos: horas extras, auxílio-transporte, adicionais de insalubridade e periculosidade, gratificação por atividades com raios-x ou substâncias radioativas e adicional de irradiação. Também suspende o adicional-noturno, exceto para aqueles que comprovarem a prestação do serviço noturno remoto das 22h às 5h.
A presidente da AdUFRJ, professora Eleonora Ziller, destacou que a universidade está num momento de maior apoio social e que os cortes podem gerar mais desgaste para o governo. “Temos a nosso favor a sociedade, que se movimenta na direção de apoiar as universidades, as atuações das áreas da saúde, as pesquisas. Mexer com profissionais que estão na linha de frente de combate ao coronavírus pode ter um custo político muito alto”, avaliou a dirigente.
Os sindicatos ouviram as argumentações do procurador da UFRJ, Renato Vianna, de que não é possível a universidade questionar, no âmbito jurídico, determinações de órgãos do Executivo sobre pessoal. “A legislação nos veda de contestar matérias de pessoal. Não temos competência para contestar este tipo de norma”, afirmou.
No momento, a PR-4 centraliza as informações sobre quem está em trabalho presencial e em teletrabalho. As unidades devem enviar para a pró-reitoria essas informações. A pró-reitora de Pessoal, Luzia Araújo, não descarta que possa haver um corte de maneira centralizada e linear, em Brasília. Mas crê que o tempo seja muito curto para o governo realizar esta operação antes do fechamento da folha de abril.
As assessorias jurídicas resolveram aguardar o espelho dos contracheques, que devem estar disponíveis a partir do próximo dia 12, para decidirem quais estratégias serão tomadas para garantir a manutenção dos benefícios aos servidores.
Foto: Fernando SouzaO grupo mais vulnerável da UFRJ nesta pandemia é o de trabalhadores terceirizados. Eles respondem por todo o serviço de limpeza, manutenção dos campi e segurança patrimonial na universidade e garantem, ao fim, as atividades de ensino, pesquisa, extensão e assistência. Parte desses profissionais está com salários atrasados ou foi demitida por conta da quarentena. Por isso, não conseguem garantir o básico para suas famílias: alimento. Sensibilizada com a situação, a diretoria da AdUFRJ resolveu doar 80 cestas básicas. As 30 primeiras foram distribuídas na semana passada. Outras 50 foram entregues na terça-feira (7).
A Associação de Trabalhadores Terceirizados da UFRJ (Attufrj) é a responsável pela distribuição. Além dos funcionários de limpeza que estão com vencimentos e benefícios atrasados, a Attufrj incluiu no grupo profissionais que atuavam nos bandejões da universidade e que foram demitidos após a proibição do funcionamento de restaurantes em todo o Rio de Janeiro.
“Sem dúvidas é um alívio. Nossas contas estão atrasadas, mas, pelo menos, a gente vai ter comida na mesa”, diz uma funcionária da limpeza que prefere não ter o nome revelado por medo de retaliações.
Os profissionais reconhecem o esforço da administração central em solucionar o problema dos pagamentos, mas acreditam que as ações ainda são insuficientes dada a urgência da situação.“É muito injusto você trabalhar e não receber o fruto do seu suor. O trabalho é pesado e não somos respeitados”, desabafa.
Depois de recorrentes atrasos nos pagamentos aos trabalhadores e de fornecer equipamentos de proteção individual e materiais de limpeza de baixa qualidade, a ProServiços – empresa de limpeza que atuava no CCMN e no Ladetec – teve seu contrato rescindido pela UFRJ. O processo de contratação da nova empresa está em curso, mas ainda não foi concluído.
Diante do desfecho, a preocupação sobre como será daqui para frente é inevitável. A maior parte desses profissionais não tem casa própria. O despejo é um fantasma constante. “A imensa maioria mora de aluguel. Com a troca da empresa, não sabemos qual vai assumir, mas as escalas de limpeza continuam funcionando. Muitos estão vindo pagando a passagem do próprio bolso, pedindo emprestado até para vizinhos, na esperança de serem aproveitados”, disse outro profissional em anonimato.
Além das cestas, uma vaquinha acontece para destinar os recursos também à compra de mantimentos para os terceirizados. O funcionário Robson de Carvalho é diretor da Attufrj e disponibilizou sua conta para a arrecadação dos fundos. Até o momento, foram doados R$ 2 mil. Quem quiser ajudar, pode fazer uma transferência ou depósito para: Banco do Brasil, AG 1517-2, conta poupança 22784-6, variação 51.
Na última semana, a UFRJ conquistou repasse de R$ 85 milhões do Executivo para ações ligadas ao combate do coronavírus. A instituição agora corre contra o tempo e as dificuldades do mercado de produtos de saúde para gastar o dinheiro e salvar vidas.
Os recursos serão aplicados na compra de insumos, equipamentos, reformas nos hospitais e contratação de pessoal. Estão sendo empanhados R$ 17 milhões na compra de equipamentos de proteção individual e insumos.
A administração central estuda contratar inicialmente 300 profissionais da área da saúde, de forma emergencial, para a operação dos novos leitos que a universidade vai disponibilizar para o tratamento da Covid-19. Outra razão para a iniciativa é a substituição dos profissionais de saúde contaminados durante a pandemia. Como o governo ainda não liberou verba para pessoal, a solução deve ser a terceirização por três meses, período que poderá ser prorrogado. “Será com verba de custeio. Precisamos de gente para abrir os leitos”, explica o pró-reitor de Planejamento e Finanças, professor Eduardo Raupp.
O dinheiro para combater o coronavírus, explica o dirigente, veio de três fontes: são R$ 20,7 milhões do MEC; R$ 43,4 milhões via Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (mesmo não sendo gerida pela Ebserh, a UFRJ recebe recursos pela empresa); e R$ 21,3 milhões de uma emenda da bancada federal do Rio de Janeiro.Todas as emendas parlamentares, explica o pró-reitor, foram direcionadas para ações do Ministério da Saúde contra a pandemia. Muitas universidades perderam dinheiro. A UFRJ foi beneficiada por já contar com uma emenda voltada para o Complexo Hospitalar.
Do total, R$ 56,7 milhões devem ser aplicados em investimento, principalmente em equipamentos para o atendimento hospitalar, como respiradores. Raupp também destaca a compra de uma máquina (por R$ 380 mil) que vai ampliar a capacidade de testes de detecção do coronavírus do Laboratório de Virologia Molecular, ligado ao Instituto de Biologia.
O grande desafio é fazer o levantamento do que é necessário e comprar rapidamente. E isso tudo concorrendo com as compras do próprio Ministério da Saúde. O MEC não acatou uma proposta das universidades para centralizar a negociação com as empresas. “Isso gera uma fragmentação. Aquilo que os EUA estão fazendo com o resto do mundo, estamos vivendo em relação ao governo. As empresas preferem vender grandes quantidade para o governo do que quantidades menores para nós”, afirma o pró-reitor. “Temos orçamento, mas teremos a quantidade de que precisamos e no tempo que precisamos?”, questiona.
Uma alternativa construída com outras 46 universidades é a compra conjunta em uma espécie de consórcio liderado pela Unifesp, com a atuação de 23 servidores de várias instituições. “Além das nossas compras diretas, vamos participar desta, pra ampliar nosso poder de barganha e acelerar essas compras”, diz Raupp.
ORÇAMENTO REGULAR
Uma boa notícia é que parte do orçamento da UFRJ, cerca de 70%, foi liberada. O restante ainda depende de crédito suplementar. A situação vai permitir à universidade fazer os pagamentos das faturas dos maiores contratos, de limpeza e segurança, até junho. E até maio, dos demais. “Com isso asseguramos os serviços da universidade, evitamos demissões de terceirizados e podemos focar em salvar vidas”, observa Raupp.