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imagem materiaMédicos e profissionais de enfermagem atendem doentes de coronavírus em hospital de campanha em Manaus - Foto: Ingrid Anne/Fotos PúblicasNas últimas semanas, a escalada de casos da variante ômicron reacendeu todos os alertas de especialistas em saúde pública comprometidos com a vida e com a Ciência. O Brasil agora se vê diante do desafio de enfrentar uma variante com uma capacidade de transmissão altíssima e que já é dominante no país. A questão central é como lidar com essa nova variante no meio de um apagão de dados do Ministério da Saúde e sob o risco de o país ficar sem testes para a detecção da doença (leia matéria abaixo), e com o número de casos e de internações pressionando o sistema de saúde.
Na quinta-feira (13), o Observatório Covid-19 Fiocruz divulgou uma nota técnica alertando para o aumento da ocupação de leitos de UTI no SUS. Segundo o documento, o estado de Pernambuco e as cidades de Recife, Fortaleza, Belo Horizonte e Goiânia já estão operando com mais de 80% dos leitos ocupados (o caso mais grave é de Goiânia, onde a ocupação chega a 94%). Segundo a nota, os estados do Pará, Tocantins, Piauí, Ceará, Bahia, Espírito Santo, Goiás e Distrito Federal estão na faixa considerada de alerta médio. No Rio de Janeiro, a ocupação é de 12%.
“Estamos vendo alguns sinais, vindos de alguns estados e capitais, que podem servir de alerta para o resto do país”, explicou o pesquisador da Fiocruz Christovam Barcellos, um dos coordenadores do Observatório Covid-19. Ele pegou o exemplo do Rio de Janeiro. A taxa de positividade no município aumentou de 13% para 44%, ou seja, a cada 100 pessoas que fizeram o teste, 44 foram diagnosticadas com a doença. Em apenas um dia, a última terça-feira (11), a cidade registrou 10.489 novas infecções, mais do que o que foi registrado durante todo o mês de dezembro. O número de testes para covid-19 também cresceu 199% na primeira semana de janeiro em comparação com a última de 2021, passando de 21.023 para 62.923 novos exames. “O Rio está com uma positividade muito grande. Mas, infelizmente, nós temos hoje acesso a poucos dados, como os de internação, de que precisaríamos para ter um quadro mais detalhado da pandemia”, alertou Christovam.
Em 10 de dezembro, o Ministério da Saúde sofreu ataque cibernético que deixou fora do ar os sistemas de informações de notificação de casos, internações e mortes, além dos dados de vacinação. Desde então, os dados de testagens, casos e mortes por covid-19 estão defasados na plataforma do ministério, ou não são confiáveis. “A falta de dados atrapalha o planejamento dos governos. Como decidir se vai haver Carnaval ou sobre a volta às aulas presenciais sem dados?”, questionou o pesquisador da Fiocruz. E em um cenário como o brasileiro, onde não há uma política coordenada de combate à pandemia, a falta de informações atrapalha também decisões individuais, observou Christovam. “Como a pessoa vai poder decidir se é seguro ou não ir ao médico, ou mandar o filho para a escola?”.

RISCO DE COLAPSO
DO SISTEMA DE SAÚDE
A variante ômicron pode ser o vírus de mais rápida propagação já registrado pela Medicina, e isso coloca no horizonte enormes desafios. Mesmo considerando a taxa satisfatória de vacinação brasileira e a aparente menor agressividade da cepa, o número de contaminados pode chegar a uma proporção que colapse o sistema de saúde. A previsão foi feita por cientistas que têm atuado com seriedade no combate à pandemia, como a médica intensivista e professora da USP Ludmila Hajjar, para quem o colapso é iminente. Até o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que tem apoiado o negacionismo do presidente Bolsonaro, admitiu em entrevista que a variante pode gerar “um novo impacto no sistema de saúde com a perspectiva de colapso e perdas de vidas”.
Para a professora da UFRJ Ligia Bahia, especialista em saúde pública, o sistema público no Rio de Janeiro está, até o momento, respondendo bem à pressão gerada pela ômicron. “O sistema está conseguindo testar, internar, não estamos mais vendo pessoas esperando por internações”, disse. Mas se for mantida essa escalada de novos casos, o cenário pode mudar. “Já estamos vendo o sistema privado colapsar, especialmente nas testagens. Então esse equilíbrio entre os sistemas público e privado pode ficar ameaçado”, explicou Ligia. Para ela, é fundamental fazer a vigilância genômica da pandemia, daí a importância dos testes. “É importante saber quais são os vírus que estão circulando. Então é preciso continuar testando e fazendo essa ação de vigilância genômica para saber quais vírus estão prevalentes”, explicou.

Especialistas alertam para desabastecimento de testes

Se um novo colapso do sistema de saúde parece iminente, a possibilidade de falta de testes assombra os estados. Os novos casos da covid-19 já ultrapassaram a marca dos 80 mil por dia no país e devem atingir seu ápice em fevereiro. A procura por testagem já é bem maior do que a oferta de insumos para os exames. O alerta foi dado nesta quarta-feira (12) pela Abramed, a Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica.

Em nota técnica, a associação orienta a utilização “criteriosa de testes para evitar risco de redução de oferta de exames para detecção da covid-19”. Embora a entidade enfatize a importância da testagem para controle epidemiológico da doença, afirma que se “os estoques não forem recompostos rapidamente poderá ocorrer a falta de oferta de exames”, tanto de PCR, considerado padrão ouro, como de antígeno, que funciona por meio de reagentes.
“Quando avaliamos as notícias que vêm de outros países, de que eles já estão sem insumos, é certo que o problema chegará ao Brasil, não sendo possível mensurar nesse momento até quando poderemos atender, pois os estoques são variados dependendo do laboratório e da região, mas há um risco real de desabastecimento”, afirma a associação, na nota.
Na prática, o desabastecimento já começa a ser sentido em alguns lugares. Farmácias de São Paulo, por exemplo, registram falta de testes rápidos. No Rio de Janeiro, os testes – que antes podiam ser realizados na hora – agora só podem ser agendados num intervalo que varia de cinco a sete dias. Ainda assim, algumas unidades da rede de Drogarias Pacheco já alertam que há tipos de testagem em falta, como as que detectam infecção por covid-19 e influenza, além dos antígenos orais.

Trabalhadores da
saúde na UFRJ
Antes mesmo do alerta da Abramed, a UFRJ mudou sua política de testagem diante do expressivo aumento da procura por testes no Centro de Triagem e Diagnóstico (CTD). A reitoria da universidade emitiu nota, no dia 11, informando que a testagem “é prioritária para profissionais de saúde em atuação presencial”. A orientação é bem diferente daquela mantida pela instituição entre o final do ano passado e a primeira semana deste mês, quando os testes eram oferecidos para toda a comunidade acadêmica.
Agora, além dos profissionais de saúde, professores, estudantes e técnicos só poderão ser testados no CTD se estiverem em atividade presencial. “Na tentativa de evitar aglomerações e a disseminação do vírus, bem como garantir a segurança de todos, orientamos que, salvo os grupos acima especificados, a comunidade universitária realize a testagem para covid-19 próximo à sua residência”, continua a nota da reitoria.

Autoteste
No meio do caos, Ministério da Saúde e Anvisa são pressionados a normatizar o uso do autoteste, aquele que pode ser feito em casa pelo próprio indivíduo. A medida, segundo as autoridades, ajudaria a diminuir a pressão no sistema público e privado de diagnóstico.
“O autoteste é um complemento aos testes realizados profissionalmente, como o PCR, não é para substituir, mas com certeza é uma medida para facilitar a identificação imediata e isolamento dos casos, e isso tem impacto muito grande no controle da pandemia”, avaliou a epidemiologista Denise Garett, presidente do grupo Sabin Vaccine Institute, em entrevista à CNN nesta quinta-feira (13).
A Frente Nacional de Prefeitos e o consórcio de prefeitos Conectar enviaram pedidos formais ao Ministério da Saúde e à Anvisa para que farmácias e drogarias de todo o país sejam autorizadas a vender o autoteste. Uma resolução da Anvisa de 2015 proíbe esses exames para doenças com notificação obrigatória, como a covid-19. Mas a resolução pode ter exceções em caso de “políticas públicas e ações estratégicas”. Essas medidas precisariam ser instituídas pelo Ministério da Saúde e aprovadas pela agência. A Anvisa ainda aguarda um posicionamento do ministério para dar andamento ao processo.
A professora Leda Castilho, coordenadora do Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares da Coppe, desenvolveu no início da pandemia um teste sorológico para detecção de anticorpos, mais barato e preciso do que aqueles que existiam à época. Embora não seja o tipo de teste de que o país precisa neste momento, para detecção da doença ativa, a professora ilustra o quanto é importante o Brasil investir em tecnologias para testagem. “Para o nosso teste não está faltando insumo e não deve faltar, até porque o nosso principal insumo somos nós que produzimos, que é a proteína S”.

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