Foto: Fernando SouzaFoi como um grito de socorro. Pressionados pela falta de recursos para honrar compromissos básicos como o pagamento de contas de água e energia, dirigentes de instituições federais de ensino do Rio de Janeiro se reuniram nesta segunda-feira (19) para expor seu dramático quadro orçamentário a parlamentares da bancada federal fluminense. O encontro foi promovido pelo Fórum de Reitores das Instituições Públicas de Educação do Estado do Rio de Janeiro (Friperj), na sede do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), no Centro do Rio.
As perdas são calculadas em cerca de R$ 3 bilhões no período, em valores corrigidos pela inflação, segundo estudo apresentado pela Friperj. Mas o principal foco de preocupação é o decreto 12.448, de 30 de abril passado, que limita a 1/18 mensais o empenho de despesas até novembro. .
A vice-líder do governo na Câmara, deputada Jandira Feghali (PC do B), mandou uma mensagem ao ministro Camilo Santana, do MEC, durante o encontro. E relatou que Santana se comprometera a trazer novidades sobre o orçamento na semana que vem. Em audiência na Câmara, na quarta-feira (21), o ministro confirmou que o presidente Lula terá um encontro com os reitores, na semana que vem, para tratar do tema.
O Jornal da AdUFRJ ouviu seis dirigentes presentes à reunião de segunda-feira e apresenta a seguir os relatos de quem vem convivendo com agonias cotidianas por conta dos recursos escassos para manter as atividades de ensino, pesquisa e extensão em suas unidades.
VICE-REITORA CÁSSIA TURCI (UFRJ)
“O decreto (12.448/2025) nos deixa com recursos insuficientes para honrar as despesas obrigatórias. Estamos fazendo todo o esforço para não cortar nada relativo à assistência estudantil. O nosso orçamento atual é menos da metade do que tínhamos há mais de 12 anos. E com esse corte nós só conseguimos bancar 43% das despesas de custeio. É muito grave a situação. Até novembro nós receberemos cerca de 60% do orçamento anual, e em dezembro os outros 40%. Uma emenda que saiu há alguns meses fixa em 30% o limite orçamentário de nossos recursos próprios, e nosso limite caiu de R$ 72 milhões para R$ 54 milhões anuais. Temos 175 cursos de graduação, 136 programas de pós-graduação, 70 mil estudantes. São nove hospitais e muitos prédios tombados. Para recuperar 75% de nossa infraestrutura física precisamos de cerca de R$ 1 bilhão. Precisamos de mais investimento. É muito importante que todas as universidades se unam em prol da manutenção da universidade pública, laica e de qualidade”.
REITOR JOSÉ DA COSTA FILHO (UNIRIO)
“Os empresários que têm contratos com a Unirio já demonstram inquietação em relação à nossa capacidade de pagamento. Viagens de gestão, assistência e permanência estudantil, subsídio à alimentação dos alunos, todas essas atividades estão ameaçadas. Temos ainda uma situação particular que vai gerar uma pressão tremenda sobre a universidade, que é a fusão do Hospital Federal dos Servidores do Estado com o Hospital Universitário Gaffrée e Guinle. Após a fusão, o Gaffrée e Guinle vai ser uma unidade acadêmica, o custeio deixará de ser bancado pela Ebserh e pelo Ministério da Saúde e passará a ser de responsabilidade da Unirio. Nosso orçamento já não dá conta de enfrentar os problemas, e a matriz orçamentária não leva em conta o financiamento da infraestrutura. Temos 15 mil alunos em 44 cursos de graduação. Espero que o governo compreenda com urgência o problema das universidades e dimensione o custo social e político que isso pode gerar para um projeto progressista e próximo às necessidades das classes populares”.
VICE-REITOR FÁBIO PASSOS
”Esse decreto (12.448/2025) nos limita a um orçamento insuficiente para manter nossas atividades. Fico particularmente preocupado com o PNAES, o programa de assistência estudantil. Isso afeta gravemente o pagamento de bolsas e o funcionamento dos restaurantes universitários, que são pagamentos continuados. Além disso, há a questão dos terceirizados, que terão seus salários atrasados caso não consigamos honrar os contratos com as empresas contratadas. É uma situação muito grave que tem que ser sanada de maneira emergencial. Já tivemos que fazer restrições severas de despesas. Temos 60 mil alunos só nos cursos de graduação, somos a maior universidade federal do país nesse critério, e estamos presentes em nove municípios do estado do Rio de Janeiro. Essa restrição orçamentária é muito grave para nós e para o Rio de Janeiro”.
REITOR ROBERTO RODRIGUES (UFRRJ e Presidente do Friperj)
“A situação orçamentária das universidades federais tem sofrido impactos ao longo da última década. Isso tem gerado um quadro insustentável de financimento do custeio básico das IFEs. Duas ações este ano vieram a agravar esse quadro. A primeira foi o corte do orçamento aprovado na LOA em relação à PLOA, de 4,6%. A segunda foi o decreto 12.448. Nossas contas são pari passu com o que recebemos de orçamento. Não podemos cortar uma bolsa pela metade. Não podemos pagar meia conta de água. Se há um bloqueio, isso limita nosso poder de pagamento frente aos nossos fornecedores e, principalmente, frente aos nossos estudantes. Decidimos só atender nesse momento a ações emergenciais na universidade. Os fornecedores estão batendo à porta, ameaçando romper contratos. A Rural tem aproxidamente 20 mil alunos e em torno de 1.500 docentes. Temos que rever de imediato esse decreto. O segundo passo é recompor o que foi cortado na aprovação da LOA. E, por fim, termos uma política de recomposição do custeio das universidades”.
REITOR RAFAEL ALMADA (IFRJ)
”Esse decreto (12.448/2025) dificulta o pagamento mensal das nossas ações. Cada mês tem uma demanda de consumo, principalmente relacionada a contas de água, luz e restaurante. Fora que ainda temos dívidas de 2024. Este ano já tem sido diferente por conta da liberação tardia do orçamento, o que gerou uma desorganização em nosso planejamento. Tivemos que reduzir contratos que já estavam em curso, e não conseguimos ampliar mais nada. Temos demandas de um campus para o aumento de vigilância, e não conseguimos contemplar isso. São 23 mil estudantes e dois mil servidores, entre técnicos e professores. O que a gente precisa é que esse olhar de investimento nas universidades e nos institutos seja um olhar diferenciado. A bancada fluminense tem nos ajudado com as suas emendas, mas não podemos viver só de emendas. Esse olhar diferenciado do governo de cada vez mais expandir as universidades e os institutos federais, fazê-los chegar à população que mais precisa, tem que chegar à equipe econômica, se refletir no orçamento”.
REITORA ANA PAULA GIRAUX (CP II)
“No Colégio Pedro II, nós já vínhamos fazendo uma série de cortes ao longo dos últimos anos, porque a restrição orçamentária não é de hoje, ela vem se acumulando. Numa situação como essa, em que esse decreto vem cortar ainda mais os nossos recursos, isso nos preocupa muito. Uma série de contratos, como limpeza, segurança, transporte, e as contas de luz e de água, que são custos obrigatórios para o funcionamento da instituição, tudo isso fica prejudicado. Se a situação não se reverter, nós temos aí julho e agosto com alguma perpectiva de pagarmos as contas. Depois disso, não vamos conseguir. Não há mais o que cortar, já reduzimos segurança, cortamos postos de trabalho na limpeza. Nós somos uma escola, funcionamos todos os dias, temos bolsas de permanência e de monitoria a manter, pagamentos a fazer aos profissionais das mais diversas áreas. Nossas atividades de ensino, pesquisa e extensão estão seriamente ameaçadas. Temos cerca de 14 mil alunos de forma presencial, e é por eles que estamos lutando”.