Fotos: Fernando SouzaAs aulas no Colégio de Aplicação seguem suspensas pelo menos até esta sexta-feira, dia 27, em consequência do desabamento do muro do colégio. A queda, na madrugada do domingo (22), felizmente não deixou feridos, mas gerou intensa revolta da comunidade escolar. Com razão. Desde fevereiro havia a informação de que a estrutura ameaçava ruir. A escola atende a crianças e adolescentes dos três aos 17 anos, além de jovens universitários das licenciaturas e pedagogia.
No dia seguinte ao acidente, um grupo de familiares e estudantes do CAp realizou um ato em frente às ruínas e cobrou apoio do governo, da universidade e da sociedade. “Estamos em um país em que não recebemos o mínimo de apoio às escolas. Como vamos formar um mundo e um país melhor sem que as nossas crianças recebam o apoio necessário?”, desabafou a estudante Sophia Mayumi, presidente do grêmio do CAp.
Mãe de uma estudante do ensino médio, Arlete Nery criticou o subfinanciamento que torna mais difícil a manutenção da infraestrutura. “O orçamento federal está sequestrado. O muro está caindo, as salas estão com infiltração, o mobiliário está precário e os profissionais são cada vez mais precarizados. É hora de a população dar apoio”. Ela também criticou a falta de envolvimento da maioria dos professores do colégio no ato. “Sabemos que há muitos professores lá dentro agora. Eles deveriam estar aqui, fazendo coro com a gente”, desabafou.
Luciana Vinagre, representante da Associação de Pais e Amigos do Colégio de Aplicação, se ressentiu da falta de informações oficiais. “Soubemos da queda do muro pelas redes sociais. Só muito mais tarde recebemos um e-mail informando que as aulas hoje estariam suspensas”, disse. “Depois disso, silêncio. Pedimos muito que entrasse na pauta da direção um plano de contingência para esse tipo de situação, mas não fomos atendidos”, criticou Luciana. A direção se reuniu com as famílias apenas na quarta-feira, 25, para dar detalhes das etapas da reconstrução.
Representante do CAp no Conselho Universitário, a professora Maria Coelho participou da etapa final do ato. Ela destacou a sorte de o acidente ter acontecido num momento em que não havia circulação de pessoas. “Era uma tragédia anunciada. Felizmente caiu de madrugada e durante um feriado prolongado. Até quando contaremos com a sorte?”, questionou.
MURO DE CEM MIL
A contratação emergencial da empresa que realizará a obra custará aos cofres da UFRJ R$ 109.297,70. O serviço inclui: o isolamento da área com tapumes e redes de proteção, a demolição, a limpeza do canteiro de obras e da calçada, além da construção de um novo muro. A obra não abrangerá só a parte que caiu, mas uma área de 40 metros de comprimento (do portão, situado na Rua Batista da Costa, até a esquina da Av. Lineu de Paula Machado). O muro terá três metros de altura e será acrescido de um alambrado de 1,5 metro.
O processo de seleção de uma empresa para realizar a obra no muro já havia sido concluído quando ocorreu o desabamento. A equipe já esteve na escola e terminou nesta quinta-feira (26) a colocação dos tapumes para fechar o colégio e separar o canteiro de obras. Na sexta (27), serão colocadas as redes de proteção para evitar que crianças tenham acesso à área. O contrato tem duração de 90 dias.
A fiscalização ficará a cargo do Escritório Técnico Universitário (ETU). Igor Ribeiro, engenheiro do Escritório de Planejamento (Eplan) do ETU, explicou que o que encarece a contratação é o conjunto de serviços, além de todo o material necessário para executar a obra. “Não será um muro de alvenaria comum. Precisará de fundação, estruturas de concreto e armação”, informou. “O valor está dentro das composições do Sinapi (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil) e ficou bem próximo do limite mínimo”, afirmou. “A dispensa de licitação não incorreu em prejuízo à administração pública”, garantiu o engenheiro.
Ribeiro elabora, neste momento, um relatório sobre o desabamento e suas repercussões no que restou do muro. “Mais de 70% do que seria necessário demolir caiu e a Prefeitura do Rio já realizou a limpeza desse entulho. Esses valores precisarão ser subtraídos do contrato”, revelou. Ao longo do domingo, equipes da Prefeitura realizaram a retirada dos escombros e sinalizaram com fitas a interdição das calçadas. “Ao mesmo tempo, outros ajustes precisarão ser feitos para adaptar os termos às atuais condições da estrutura pós-queda”, disse.
O professor Eduardo Qualharini reforça que os valores estão dentro dos praticados no mercado. “Será um muro que precisará de sapatas, de estruturas de amarração. Não conheço detalhadamente o projeto, mas, em linhas gerais, me parece um valor muito razoável. Diria até que está ligeiramente abaixo da média”, analisa o docente, que é coordenador do Núcleo de Planejamento e Pesquisa da Poli. Engenheiro civil de formação, ele afirma que uma série de fatores podem interferir no custo de um projeto. “Há custos diretos e indiretos. A urgência da obra também é um fator de cálculo”, sublinha.
RUA ISOLADA
Toda a rua já estava isolada pelo Corpo de Bombeiros no momento do desabamento. “Desde fevereiro temos monitorado o muro diariamente e no sábado, 21, percebemos uma maior movimentação da estrutura. Acionamos a reitoria e os Bombeiros, que isolaram a rua de ponta a ponta”, informou a diretora Cassandra Pontes. “Ao longo da madrugada, o muro foi caindo devagar”, contou. Uma árvore teria causado o dano estrutural. “Temos inúmeros chamados para a Prefeitura do Rio para a retirada ou poda desta árvore. Todos sem resposta”, lamentou a diretora.
REITORIA
Vice-reitora da UFRJ, a professora Cássia Turci destacou que a administração central realiza uma série de esforços, mas esbarra na falta de recursos. “São problemas sérios de infraestrutura não só no CAp, mas também na Educação Física, no JMM e em outras edificações. Todas estão na nossa lista de prioridade”, afirmou.
O reitor Roberto Medronho informou que a obra será concluída em até dois meses. “Lamentamos profundamente o ocorrido, mas olhamos para frente com responsabilidade e trabalho”, afirmou. “O CAp é um colégio público, gratuito e de excelência e seguirá assim”.
OPINIÃO
A QUEDA DO MURO DO CAp UFRJ foi decorrência de um problema conhecido, reconhecido, embora não devida e tempestivamente solucionado. Um problema que se soma a inúmeros outros decorrentes da infraestrutura envelhecida e desgastada das instalações físicas de várias unidades acadêmicas da UFRJ.
SÃO MUITAS AS EMERGÊNCIAS, cada uma é singular, prioritária e urgente. Estamos diante de uma conjuntura dura e prá lá de espinhosa, exigente de iniciativas que apontem alternativas para o funcionamento pleno da UFRJ.
AINDA DURANTE A PANDEMIA, retomamos atividades presenciais. O retorno de alunos, professores e técnicos tem se demonstrado acertado, embora as condições de funcionamento da UFRJ nem sempre sejam adequadas. Ao correr da irresponsabilidade de abandonar os alunos, interromper aulas e
semestres letivos, o teste da infraestrutura pegou. O que fazer? Manter as atividades e nos unir para buscar compatibilizar relevância social com orçamento suficiente.
LIGIA BAHIA
Professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva