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WhatsApp Image 2025 08 19 at 19.03.19 6Foto: Fernando Souza/Arquivo AdUFRJAmizade e gratidão: Michel Misse

Paulo Baía
Sociólogo, cientista político, professor da UFRJ

Conheci Michel Misse em 1970, numa festa em Santa Teresa, na casa de Maria Lúcia, que então era casada com Dilson Motta. Eu vivia meu casamento com Helena Pires. Angela Tigela, Maria Lúcia e Helena formavam um trio inseparável. Entre conversas, risos e cumplicidade, Michel se tornou uma presença constante. Logo, fizemos militância juntos e dividimos salas de aula em cursos pré-vestibulares, enquanto eu ainda me dedicava à estatística na ENCE.
Em 1972, prestei vestibular para o IFCS/UFRJ, decisão para a qual Michel foi um dos maiores incentivadores. A confiança dele me atravessava como certeza de que eu poderia ir além. Nossa amizade era feita não só de encontros, mas de empurrões generosos na direção dos sonhos. Ele acreditava antes que eu mesmo acreditasse.
Em 1978, comecei a lecionar na UFRJ, na área de metodologia e técnicas de pesquisa, e também sociologia geral. Era um tempo em que minha militância crescia, com as eleições daquele ano e a campanha pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita para todas as vítimas da ditadura de 1964, do AI-5 e do 477. Tentava conciliar essa intensidade com a escrita de uma dissertação de mestrado em Ciências Sociais na PUC/SP e com as responsabilidades como professor. Não consegui. A vida exigia mais horas do que eu podia oferecer.
Em 1987, com o início dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, fui convidado para integrar a assessoria. Michel deu toda a força, ajudando inclusive no trâmite burocrático para que a UFRJ me colocasse à disposição. E assim fui para Brasília viver um dos momentos mais importantes da minha trajetória.
No início de 1991, mais uma vez Michel esteve ao meu lado, incentivando-me quando recebi o convite de Leonel Brizola e Cybilis Vianna para assumir uma das subsecretarias de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro. Em janeiro de 1995, retornei ao IFCS/UFRJ, mesmo tendo recebido propostas sedutoras, como a de Mário Covas para São Paulo, e o aceno de Artur da Távola para voltar ao Parlamento.
Eu estava pronto para pedir demissão da UFRJ. Meu perfil acadêmico parecia defasado, sem mestrado nem doutorado. Michel me contou que também não havia defendido sua tese de mestrado no IUPERJ, mas que o faria, e depois seguiria para o doutorado. Ele e Marco Antônio Melo me convenceram a continuar como docente, a mergulhar de vez na vida acadêmica. Com a ajuda deles, de Gisalio Cerqueira, Gizlene Neder, Charles Peçanha e Antônio Celso, segui esse caminho.
Fiz o mestrado em Ciência Política na UFF, com Michel e Gisalio na minha banca. Em seguida, ingressei no doutorado em Ciências Sociais no CPDA/UFRRJ. Mais tarde, voltei à UFF para um pós-doutorado em História Social, sob supervisão de Gizlene Neder. Voltei pleno ao IFCS/UFRJ para a segunda etapa da minha vida universitária.
Michel e Marco Antônio Melo me convidaram para fundar o NECVU. Éramos nós três e Heloísa. Essa foi mais uma construção compartilhada, mais uma semente que germinou da amizade e da confiança mútua.
Mas a amizade não se fez apenas nos espaços acadêmicos e políticos. Ela também dançava nos bailes da Estudantina, no Carnaval da Banda de Ipanema, no Simpatia é Quase Amor, no Bloco de Segunda e no fabuloso Maracangalha. Foram décadas de encontros, de risos, de projetos e de sonhos compartilhados.
Hoje, sinto tristeza pela partida de Michel, mas também alívio pelo fim de seu sofrimento. Sinto gratidão à vida por ter permitido que nossos caminhos se cruzassem e se mantivessem lado a lado. Ficam as memórias e o que construímos juntos. Fica a certeza de que amizade é um patrimônio que nem a morte dissolve. Michel Misse permanece em mim, nas histórias, nos gestos, nas marcas que deixou, no afeto que jamais se apaga.

Em 14 de agosto de 2025, em Cabo Frio (RJ).

 

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