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WhatsApp Image 2023 05 04 at 18.46.14 2Fotos: Fernando SouzaAo som do berimbau, professoras e professores viajaram para o Brasil do século XVII. Oferecido pela AdUFRJ aos docentes sindicalizados, o passeio durou toda a manhã de sábado, 29, e encantou os participantes. Foi uma visita guiada afrorreferenciada – contada sob a perspectiva dos povos escravizados no país. O roteiro percorreu a chamada Pequena África, na região portuária do Rio. Lá, especificamente no Cais do Valongo, desembarcaram mais de um milhão de negros escravizados, vergonhoso fato que o tornou o maior porto receptor de mão de obra escrava do mundo.
O passeio, com 30 vagas, foi esgotado na primeira semana em que foi anunciado pela diretoria da AdUFRJ. A imersão começou às margens da Baía de Guanabara, ou Guanapará, como era chamada por cerca de 20 mil indígenas que viviam no seu entorno, quando os portugueses chegaram ao Brasil, no século XVI. Houve outros quatro pontos de parada: na Igreja de São Francisco da Prainha, cuja construção se iniciou em 1.696; no Largo de São Francisco da Prainha – a igreja e a praça levam esse nome porque havia uma praia onde hoje é a rua Sacadura Cabral; na Pedra do Sal, local de desembarque do sal importado da Europa, durante o Brasil-Colônia; e no Cais do Valongo – redescoberto em 2011, nas escavações para obras das Olimpíadas de 2016.
Em cada parada, mais uma história de resistência era desvelada sob olhares e ouvidos atentos de rostos jovens e maduros. Primeira diretora da Divisão de Saúde do Estudante, da então Superintendência de Políticas Estudantis, a professora Marilurde Donato, aposentada da Escola de Enfermagem Anna Nery, estava ansiosa por cada momento. “Minha expectativa é alta a cada ponto. Esse passeio serve para nos informar melhor e para nos formar”, opinou.WhatsApp Image 2023 05 04 at 18.46.14 3
Professora da Fisioterapia, Waleska Silveira levou os sobrinhos de 16 e 19 anos. “A gente já planejava fazer um passeio como este pela cidade e a AdUFRJ nos proporcionou a oportunidade perfeita”, contou. “Esse passeio nos faz conhecer uma perspectiva que a gente não aprende nas escolas”, observou Bernardo Correia, estudante do ensino médio. “Estou achando tudo muito interessante. As músicas tocadas são muito bonitas. Uma experiência enriquecedora”, completou a irmã, Ana Clara Correia, estudante de Engenharia de Alimentos da UFRJ.
Num dos pontos, descobrimos mais sobre o angu, prato tradicional e sagrado da culinária afrobrasileira, originalmente chamado zungu e proibido pelo Estado brasileiro. “As casas de zungu eram locais onde se fazia a comida, onde se reuniam muitos negros, onde tinha batuque”, contou Gabriel Siqueira, historiador e guia do passeio. “Era feito e vendido pelas negras minas no Rio, mulheres auto-organizadas, matriarcas do povo negro”. Eram conhecidas como negras minas por virem do Porto das Minas, na África.
Os ensinamentos da manhã de sábado foram transformadores. “A gente aprende tanta coisa! Estou gostando muito, muito!”, exclamou a professora Regina Célia Reis Nunes, aposentada do Instituto de Macromoléculas. “A AdUFRJ me presenteou com esse passeio que eu já queria fazer há tempos. Que passeio bom”, elogiou.
D3 5844“O professor é excelente. Tem realmente um conhecimento muito aprofundado”, completou a professora Lea Miriam Fonseca, aposentada da Faculdade de Medicina. “É muito importante a gente saber sobre a nossa história. Eu me emocionei em vários momentos”, revelou. “Parabéns à AdUFRJ pela iniciativa. Espero que esse programa continue e que a AdUFRJ me convide para os próximos”.
Quem também elogiou a programação foi a professora Angela Maria Pacheco, aposentada da Escola de Química. “Adorei o passeio. Aprendi muito aqui”, disse ela, que fez ainda uma sugestão. “Espero que haja outros passeios históricos e também ecológicos, com destaque para a botânica e meio ambiente”.
A próxima turma desbravará a Pequena África em 27 de maio, com ponto de encontro em frente ao Museu de Arte do Rio. Para participar, basta enviar um e-mail para Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. com assunto “Pequena África”. O passeio é gratuito para professores filiados. Os aposentados têm direito a um acompanhante inteiramente grátis. Outros acompanhantes pagam R$ 30.

GUIA, CAPOEIRISTA,
HISTORIADOR, PROFESSOR

O guia da imersão na Pequena África foi o historiador Gabriel Siqueira, doutor em Políticas Públicas e Formação Humana e professor da educação básica e da Uerj. O docente também é capoeirista e escreveu os livros “Cativeiro Carioca”, que conta a história da perseguição aos capoeiras nas ruas do Rio de Janeiro, entre 1888 e 1930, e “Uma questão de raça – racismo, ações afirmativas e o caso da Uerj”, uma adaptação de sua tese de doutorado.
“Em 2022, fez 21 anos de ações afirmativas na Uerj, onde fiz o doutorado, e foi a ocasião para o lançamento do segundo livro, que é fruto da minha tese”, explica o historiador. “Mas, em 2015, já com algum acúmulo dessa perspectiva histórica, lancei ‘Cativeiro Carioca’, que trabalha a hipótese de cativeiro a céu aberto, com a criminalização da capoeira e o fenômeno do feitor público, papel desempenhado pela Guarda Real da Polícia no Rio de Janeiro”, conta o autor.
Guiar professores universitários a uma história ainda negligenciada pela academia é mais que um trabalho, é uma missão para o historiador. “Participar de um encontro de gerações, com professores com mais de 30 anos de magistério, me mostra o quanto a história do nosso povo ainda não está disponível para o grande público”, observa Gabriel Siqueira. “História que foi apagada, nomes e sobrenomes propositalmente apagados, para desumanizar o nosso povo. Eu me sinto realmente cumprindo a missão de divulgador dessa história que a História ainda não conta amplamente”.
Além do roteiro pela Pequena África, o historiador trabalha com outros circuitos afrorreferenciados, como visitas a quilombos, e vivências em aldeias, como a dos Pataxós de Parati.

 

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