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Já são 19 universidades e institutos federais que sofreram intervenção no governo Bolsonaro. O modus operandi, em geral, é o mesmo: o presidente desrespeita a consulta pública e os votos dos colegiados universitários, e escolhe candidatos menos votados, normalmente figuras alinhadas à sua política de desmonte da educação pública, na lista tríplice enviada pelas instituições ao MEC. Isso quando não nomeia quem sequer participou do processo — caso da UFGD, por exemplo — ou designa um reitor pro tempore, como fez na UFS. Mas a última intervenção, ocorrida semana passada na Universidade Federal de Pelotas, seguiu outro script. Bolsonaro nomeou como reitora a segunda colocada da lista tríplice, Isabela Fernandes Andrade. Ele fez parte da chapa eleita pela comunidade, e seria pró-reitora da nova gestão. A universidade decidiu então que Isabela e o professor Paulo Roberto Ferreira Júnior, o mais votado na lista tríplice, farão a gestão compartilhada da reitoria. A partir dessa inovadora forma de resistência, o Jornal da AdUFRJ começa nesta edição uma série de reportagens sobre o cenário em algumas dessas instituições sob intervenção, mostrando como a autonomia universitária está sob ataque.

Pelotas inova com dupla na gestão compartilhada

A chapa UFPel Diversa, que tinha o professor Paulo Roberto Ferreira Júnior como candidato a reitor, teve 56% dos votos na consulta pública. Diante do risco de ter a universidade sob o controle do governo, o Conselho Universitário e os concorrentes no pleito concordaram que o colegiado votaria apenas em membros da chapa vencedora. Paulo teve 56 votos. A professora Isabela Fernandes de Andrade ficou em segundo lugar, com seis votos, e Eraldo Pinheiro, com dois. Isabela foi a escolhida pelo presidente Jair Bolsonaro. A comunidade acadêmica inovou na resposta a mais esse ataque à autonomia universitária e decidiu que a UFPel terá dois reitores: Isabela, a nomeada, e Paulo, o mais votado, vão compartilhar a gestão no período 2021-2025.
Oficialmente, Paulo Roberto Ferreira Júnior vai assumir a pró-reitoria de Planejamento, cargo que seria de Isabela, mas a intenção é que os dois trabalhem em conjunto à frente da universidade. Isabela como gestora oficial e Paulo como representante político da comunidade. “Não era a minha intenção assumir a reitoria da universidade”, explicou a professora em uma transmissão ao vivo realizada pela UFPel no último dia 7. “Lamento pela não nomeação do reitor eleito desta universidade. “A partir de amanhã, Paulo e eu estaremos juntos na reitoria da Universidade Federal de Pelotas em uma soma de reitora nomeada com reitor eleito, fazendo uma gestão a quatro mãos, colaborativa, compartilhada”, explicou.
A transmissão foi conduzida pelo então reitor da UFPel, Pedro Hallal, no último dia do seu mandato. Paulo Roberto Ferreira Júnior também participou do evento e começou a sua fala dizendo que a universidade foi golpeada pelo governo federal, mas clamou pela união da comunidade universitária. “O governo e seus asseclas tentam, com essa nomeação, gerar conflito, dúvida e desunião na nossa comunidade, não podemos permitir que isso aconteça.
Segundo o professor, é uma tradição da UFPel que a lista tríplice seja sempre composta por membros da chapa vencedora na consulta pública. “Sempre fomos precavidos quanto à nomeação de um reitor que fosse desalinhado com a proposta escolhida pela comunidade”, contou. Paulo ainda reforçou o seu compromisso com o programa eleito e com seu grupo. “Trabalhamos juntos e construímos esse projeto juntos. Somos um grupo que tem um reitor eleito e uma reitora nomeada, e temos um programa de gestão escolhido democraticamente pela comunidade”, afirmou Paulo, pedindo o apoio de toda a universidade.
Alguns setores da UFPel se insurgiram contra a intervenção, e não receberam bem a forma de resistência com dois reitores compartilhando a gestão. “Nós estamos rompendo com o princípio da autonomia universitária, estamos aceitando um interventor”, disse a presidente da ADUFPel, Celeste Pereira. “A professora Isabela não concorreu no processo eleitoral. Em que pese que ela seja uma pessoa do mesmo campo político do reitor eleito, ela está passando pelo mesmo processo, como interventora, que qualquer outro nome”, explicou a professora.
Para o sindicato, a nomeação de alguém que não venceu a eleição é uma intervenção por princípio. Mas Celeste sabe que a oposição a ser feita deve ser contra a intervenção, e não contra a professora nomeada. “Para nós, o papel das entidades de classe é defender princípios. A escolha de uma gestão compartilhada é da gestão, e as entidades não foram consultadas a esse respeito”, disse a professora. “Estamos em assembleia permanente, e o nosso debate é exatamente esse: a nossa oposição não é a Isabela, mas ao processo. Não queremos um interventor na universidade”. De acordo com a professora Celeste, o DCE e o sindicato dos técnicos da UFPel (ASUFPel) compartilham da mesma posição, e as três entidades vão trabalhar em conjunto para enfrentar a intervenção. “Estamos organizando algumas manifestações contra a intervenção, não contra a professora Isabela. É pela garantia do direito constitucional da autonomia da universidade pública e da democracia”, relatou.
A decisão de ter dois reitores é inédita. Segundo o professor de Direito Constitucional da UFRJ, Luigi Bonizzato, as universidades têm em suas estruturas administrativas pró-reitores justamente para que o trabalho do reitor seja dividido, e Paulo Roberto Ferreira Júnior assumir uma pró-reitoria o coloca na estrutura administrativa da UFPel. “Dentro da universidade, do corpo social, não podemos impedir que o professor Paulo também seja considerado um reitor”, explicou o professor. Para ele, a princípio, a separação clara entre as responsabilidades legais e políticas dos dois reitores não deve criar problemas legais, mas o ineditismo da situação não permite uma resposta contundente sobre a segurança jurídica do arranjo. “Evidentemente existem questões políticas e de direito que ora se entrelaçam, e ora se unem. E esse é um exemplo claro disso”, disse.

Intimidação é arma de interventor da UFPB

WhatsApp Image 2021 01 15 at 10.32.38O interventor da Universidade Federal da Paraíba não teve nenhum voto no colégio eleitoral, e mesmo assim foi nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro. Na consulta pública e no colegiado, a vencedora foi a professora Terezinha Martins, com 46% dos votos na consulta e 47 votos no colégio eleitoral. O interventor nomeado, Valdiney Veloso Gouveia, que passou em branco no colégio eleitoral, teve apenas 5% dos votos na consulta pública. Seu nome só constou na lista tríplice graças a uma decisão judicial, que está sendo contestada pela ADUFPB. Valdiney foi nomeado no começo de novembro passado e, desde então, vem tentando intimidar setores da universidade e atacar direitos de professores e servidores.

“Há muita insatisfação e indignação da comunidade universitária em todos os setores, de docentes, técnicos e estudantes”, contou o presidente da ADUFPB, Fernando Cunha. “Junto com sua equipe de assessores e o procurador da universidade, ele tentou intimidar o sindicato, para impedir uma atividade de paralisação”, lembrou Fernando. “O procurador disse que não recebeu a nossa notificação e disse que ia cortar nosso ponto. Mas era uma bravata”. O professor diz ainda que o procurador tentou intimidar um centro acadêmico e o movimento estudantil da universidade. A reitoria também tentou incriminar estudantes que ocuparam o acesso à reitoria em uma manifestação contra a intervenção.
A truculência do interventor é uma tentativa de calar a ruidosa oposição contra ele na UFPB. “Nós fizemos três atos públicos, cada um com mais de duas mil pessoas, fizemos uma vigília virtual contra a intervenção”, relatou Fernando Cunha. Mas o dirigente sindical reconhece que os atos aconteceram em outro momento da pandemia, quando o número de casos no estado era estável. “Esse é um enorme desafio. Estamos procurando outros caminhos de mobilização e organização”, disse o professor. “Nós vamos fazer uma assembleia no início de fevereiro e vamos nos reunir com outras lideranças da UFPB para pensar nessa estratégia”.
Valdiney tem um perfil alinhado ao governo federal de desmonte das universidades e adesão ao programa Future-se — iniciativa proposta pelo MEC, na gestão do funesto ministro Abraham Weintraub, para que as instituições federais de ensino busquem recursos privados para se manter. Uma das decisões tomadas pelo interventor foi emitir um boletim que desfazia progressões funcionais, desde 2015, de mais de 300 professores, sob pena de devolução de recursos pelos docentes. “Acionamos nossa assessoria jurídica e vamos à Justiça para brigar por esse direito”, contou Fernando Cunha. Para o dirigente sindical, a medida foi uma maneira de remanejar recursos com o corte de orçamento. “Assim, ele mantém a atividade e se sai bem com o governo federal”.
O interventor tentou reiniciar as aulas presenciais, passando por cima dos conselhos superiores da universidade, mas voltou atrás ao perceber que não teria força contra os colegiados. A relação de Valdiney com o Conselho Universitário é turbulenta. “Nós temos conseguido conter as decisões arbitrárias dele”, contou Clodoaldo Gomes, representante do sindicato dos técnicos no conselho. “Ele tem adotado uma postura de desqualificar os conselheiros, alegando que suas posturas são ideológicas. Como se ele fosse ideologicamente neutro, mas ele não é”, disse Clodoaldo.

Conselho Universitário enfrenta ataques na UFRGS

WhatsApp Image 2021 01 15 at 10.36.43Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o reitor Rui Oppermann foi reeleito na consulta pública e no Conselho Universitário, onde recebeu 45 votos. Mesmo assim, o presidente Bolsonaro escolheu o professor Carlos Bulhões, o terceiro lugar da lista, que recebeu apenas três votos. Bulhões foi nomeado em setembro passado, e desde então vem tentando, de maneira arbitrária, implantar na universidade o projeto de destruição defendido pelo governo federal.
“Estamos observando uma desconstrução da administração da universidade. O interventor está tomando atitudes que são contrárias ao estatuto e promovendo mudanças que resultam em uma fragilização da UFRGS como universidade de ponta”, contou o reitor eleito Rui Oppermann. Uma das mudanças mais significativas que o interventor fez foi fundir as pró-reitorias de Graduação e Pós-Graduação. “A UFRGS tem uma pós-graduação muito forte, e que precisa da autonomia de uma pró-reitoria para a sua expansão. E agora a vemos transformada em um departamento sem nenhuma justificativa”, explicou o professor.
De acordo com Rui Oppermann, as mudanças na estrutura da UFRGS são feitas com a justificativa de “dinamizar a gestão”. “Eles ainda estão fazendo uma gestão por inércia, com base no que deixamos pronto. Mas agora eles terão que colocar as suas posições mais claramente”, explicou Rui, que defende que nesse momento o movimento de oposição à intervenção vai precisar agir.
E a oposição ao interventor está atenta. “Cabe ao sindicato encaminhar as nossas lutas, mantendo a nossa postura contrária à forma como ele foi nomeado, e defender a autonomia da universidade”, explicou o professor Lúcio Vieira, presidente da ADUFRGS. A pandemia obriga a se pensar em novas maneiras de fazer atos políticos. “A pandemia é um grande dificultador das mobilizações”, explicou o professor. “O que temos feito é manifestado nosso descontentamento às mudanças que estão sendo colocadas pelo interventor”, relatou. Para Lúcio, o Conselho Universitário tem sido uma instância importante de enfrentamento. “Nós temos um conselho muito identificado com a autonomia universitária”.
A professora Márcia Barbosa compõe o Conselho Universitário (Consun) da UFRGS e contou que, além de fundir as pró-reitorias de Graduação e Pós-Graduação, o interventor criou uma pró-reitoria de Inovação, e só depois convocou uma reunião do colegiado. “Ele não pode mudar a estrutura da universidade, essa estruturação é do Conselho Universitário”. Mas, de acordo com a conselheira, as reuniões virtuais do Consun não estão sendo um espaço para um debate amplo e democrático. “O interventor estabeleceu um limite de tempo para toda reunião. Como ele é presidente da mesa, começa com assuntos pouco importantes, uma enrolação”, relatou a professora. “Se fosse presencialmente, a pressão para não encerrar a reunião seria diferente, mas na reunião virtual ele simplesmente derruba a conexão quando dá a hora estipulada”. A estratégia do interventor impede que temas relevantes que o desagradem sejam votados. “Toda reunião é tensa e algumas discussões levam várias semanas”, desabafou.

INTERVENTÔMETRO

WhatsApp Image 2021 01 15 at 10.36.43 1A comunidade da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) respirou aliviada esta semana. Após acompanhar intervenções do governo em instituições coirmãs da capital do estado (UFRGS) e na vizinha Pelotas (UFPel), um decreto publicado nesta quinta-feira (14) trouxe a nomeação do professor Danilo Giroldo para a reitoria.
Giroldo foi o candidato a reitor mais votado no Colégio Eleitoral da FURG e integrou a chapa escolhida pela comunidade acadêmica, em consulta realizada no mês de outubro. O professor assume a gestão por quatro anos em solenidade que será marcada nos próximos dias.
Também esta semana, foi oficialmente encerrada uma intervenção no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). O professor José Arnóbio de Araújo Filho, escolhido pela comunidade acadêmica, assumiu a reitoria do IFRN no lugar de um pro tempore indicado pelo MEC.
A nomeação atendeu a uma decisão da Justiça Federal. O MEC alegava que Arnóbio não poderia assumir o cargo por estar respondendo a um processo administrativo. O Ministério Público Federal discordou da pasta da Educação, mas o impasse durou oito meses até ser resolvido. (Kelvin Melo)

 

WhatsApp Image 2021 01 08 at 10.54.13Mais um trabalho pioneiro sai dos laboratórios da UFRJ. Desta vez, envolvendo transportadores de fosfato e células tumorais. Pesquisadores da universidade, ligados ao Laboratório de Bioquímica Celular, do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis (IBqM), descobriram que altas concentrações dessas proteínas no sangue podem contribuir para aumentar a velocidade de desenvolvimento de um câncer e sua posterior metástase.
Os experimentos foram realizados com células normais e tumorais de mama, em laboratório. E apontam para um futuro promissor. Além de ajudar a entender o mecanismo que pode estar por trás do surgimento de tumores, também indicam a possibilidade de novos tratamentos e até um diagnóstico ainda mais precoce, logo nos primeiros momentos da instalação de um câncer ou, quem sabe, antes que ele aconteça. “Ainda são necessários outros estudos para se chegar a este patamar, mas são possibilidades que se abrem para o futuro”, admite o professor titular do IBqM José Roberto Meyer, coordenador do estudo. “Ciência precisa de investigação”, ele afirma.
O docente, que faz parte da lista dos cientistas mais influentes do mundo – publicada pela revista Plos Biology e replicada pelo Jornal da AdUFRJ, em dezembro –, explica que já estudava os transportadores de fosfato em protozoários e que a ideia de investigá-los em células de câncer surgiu quando ele percebeu que não havia estudos mais aprofundados nessa área. “Nunca foi dada muita ênfase aos transportadores de fosfato em células tumorais, mas o fosfato é fundamental para qualquer célula”, aponta. “Ora, se as células normais já necessitam desse nutriente para gerarem energia, nossa teoria era de que células tumorais precisariam de muito mais fosfato, já que demandam muito mais energia por conta de sua alta capacidade de multiplicação”, explica.
A hipótese se confirmou. Em 2018, eles publicaram o primeiro trabalho, depois de três anos de investigação, na revista Plos One. Foi a primeira caracterização bioquímica dos transportadores de fosfato dependentes de sódio em células cancerígenas da literatura. “Percebemos que a célula tumoral de mama tinha muito mais transportadores de fosfato do que células de mama normais”.
Em 2019, um novo trabalho foi publicado, desta vez caracterizando outro grupo de transportadores de fosfato que não dependem de sódio, mas de prótons. Novamente, eles foram os primeiros a fazer este estudo no mundo. “Investigamos um mecanismo potencialmente importante para explicar por que células normais se transformam em tumorais”. Mas ele alerta que não se pode reduzir a tumorigênese, ou seja, a origem de um tumor, à quantidade de fosfato no sangue. “Ainda há alguns resultados que precisam ser relacionados para que a gente possa ter certeza dessa afirmação”.
No final do ano passado, outro artigo, desta vez publicado no International Journal of Molecular Sciences, trouxe mais avanços às descobertas. “Comprovamos que o transportador de fosfato protodependente tem papel crucial no desenvolvimento do câncer. E buscamos trabalhar com inibidores de fosfato inorgânico para avaliar se haveria diminuição da velocidade da propagação do tumor”, revela o doutorando Marco Antonio Lacerda Abreu, primeiro autor dos últimos trabalhos publicados pelo grupo.
As drogas PFA (ácido fosfonofórmico, utilizado em tratamentos de infecções por herpesvírus e citomegalovírus) e PAA (ácido fosfonoacético), além de inibirem as proteínas transportadoras de fosfato, tiveram repercussão no câncer. “O experimento deixou bem claro o papel dos transportadores no processo tumorigênico já que, ao inibí-los, observamos o câncer diminuir sua velocidade de propagação e regredir a um estágio menos invasivo”, afirma Marco Antonio.
A pós-doutoranda Thais Russo Abrahão Barcellos, primeira autora do trabalho divulgado em 2018 e coautora das demais publicações do grupo, reforça a descoberta. “Esses inibidores também dificultaram ou impediram os processos de metástase nas células cancerígenas. É claro que não podemos usar um inibidor que mate as células saudáveis, por isso é difícil encontrar drogas que façam esse trabalho afetando somente esses transportadores que vão alimentar o tumor”.
A jovem cientista enfatiza a importância da pesquisa básica. “É ela que dá os fundamentos para as pesquisas que serão realizadas depois, como o desenvolvimento de novos tratamentos ou novos medicamentos”, diz. “Não necessariamente a gente vai descobrir a cura do câncer, mas a gente pavimenta o terreno para que outros descubram”, orgulha-se.
Agora, os pesquisadores estudam as moléculas sinalizadoras, que indicam para o metabolismo celular que caminho deve ser seguido a partir de diferentes níveis de fosfato. Ou seja, de que forma essas células vão se comportar. Algo que pode indicar com mais precisão a razão pela qual uma célula saudável pode se tornar um câncer. “Estamos fazendo essas correlações”, diz o professor Meyer, que orienta Marco e Thais nas pesquisas. “Esta etapa nos trará novas respostas, mas já é tema para outro trabalho”, finaliza Thais.

Estamos ansiosos.

PERFIL

WhatsApp Image 2021 01 08 at 10.54.49José Roberto Meyer Fernandes
59 anos

Professor titular do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis

Coordenador do trabalho
Chefe do Laboratório de Bioquímica Celular do IbqM

Graduação em Ciências Biológicas, mestrado e doutorado em Biofísica pela UFRJ, pós-doutorado na University of Arizona

Pesquisador Nível 1B do CNPq

WhatsApp Image 2021 01 08 at 10.54.53Marco Antonio Lacerda Abreu
27 anos

1º autor dos últimos trabalhos e orientando do professor José Roberto Meyer Fernandes

Graduação em Ciências Biológicas, com ênfase em Biotecnologia pela UFRJ (Campus Duque de Caxias), mestrado e doutorado (em andamento), em Química Biológica pelo IbqM

WhatsApp Image 2021 01 08 at 10.54.54Thais Russo Abrahão Barcellos
34 anos

1ª autora dos primeiros trabalhos da série e coautora dos mais recentes, orientanda do professor José Roberto Meyer Fernandes

Graduação em Ciências Biológicas, mestrado em Química Biológica e doutorado em Ciências Biológicas — Microbiologia pela UFRJ.

Atualmente faz seu pós-doutorado no Laboratório de Bioquímica Celular do IBqM

 

WhatsApp Image 2021 01 08 at 11.30.52O destino de um tesouro da intelectualidade brasileira preocupa acadêmicos do Rio de Janeiro. A família do professor Carlos Lessa, falecido em 5 de junho, anunciou, no fim do ano passado, a intenção de vender a biblioteca de 17 mil volumes do ex-reitor da UFRJ e ex-presidente do BNDES. Amigos e admiradores de Lessa, que temem a fragmentação do acervo, querem preservar a coleção na capital carioca, de forma unificada e acessível ao público.
“Estamos precisando fazer caixa por causa da crise econômica provocada pela covid-19, a morte do meu pai e um problema de saúde da minha mãe”, explica um dos filhos do ex-reitor, o músico Rodrigo Lessa. “A gente teria alegria em doar para uma instituição, mas a situação não nos permite fazer isso”, completou.
Rodrigo explicou que, desde o início, a família tentou fazer a venda conjunta, conversando com um círculo mais próximo de amigos e conhecidos. Sem sucesso, anunciou a venda em 21 de dezembro, que poderia ser fatiada. Mas, diante do apelo de várias pessoas, recuou no dia seguinte. “Que bom que mais gente pensa como eu pensava. A ideia agora é vender a biblioteca do Carlos Lessa”, disse. A pausa na venda, porém, tem um prazo. O músico espera resolver a situação em até 45 dias. “A nossa preferência é que a biblioteca dele fique íntegra e acessível ao público. Queremos manter a memória do meu pai”, completou.
Presidente da AdUFRJ, a professora Eleonora Ziller é uma das pessoas que abraçaram a causa: “Queremos lançar uma campanha para que a biblioteca não saia do Rio de Janeiro e fique num lugar público, de acesso gratuito, mesmo que não seja na UFRJ. Mas o ideal seria ficar na universidade, onde Lessa foi professor e Reitor”, defende. “Assim que saiu a notícia, muitos reagiram contra a possível venda separada”.
O pior cenário, para Eleonora, seria o acervo sair do país. “Principalmente para os EUA, onde há sempre compradores interessados. Não é raro alguém encontrar nas bibliotecas norte-americanas livros que estão esgotados aqui. Foi assim que quase perdemos o acervo do Augusto Boal”.
Eleonora nunca viu a biblioteca do ex-reitor, mas diz que é possível se ter ideia de seu valor só pelo livro escrito por Carlos Lessa: “O Rio de Todos os Brasis”. “A bibliografia é incrível. Ele tem de tudo. Há muitas preciosidades ali”.
Professor da Faculdade Nacional de Direito, Mauro Osório avalia a campanha pela biblioteca de forma positiva. “Acho a iniciativa maravilhosa. Com a decadência do Rio nos últimos anos, estamos perdendo algumas bibliotecas. A do Lessa é uma joia rara. Se a gente tiver meios de articular isso, será muito importante para o Rio de Janeiro”, argumenta.
Osório observa que a coleção do ex-reitor guarda muitas obras sobre a cidade. “Que é muito pouco estudada. A tradição no Rio de Janeiro é pensar o Brasil e o mundo. O Lessa era um dos poucos intelectuais que procuravam conciliar uma reflexão sobre o Brasil com uma reflexão sobre o Rio de Janeiro”, afirma.
O professor foi agraciado pela família com a doação dos documentos de Lessa sobre o Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro. O ex-reitor ocupou o cargo de diretor-executivo do plano, durante a prefeitura de César Maia. “Sempre tive uma relação muito próxima com ele”, diz.
O docente teve o privilégio de visitar a biblioteca uma vez, há alguns anos, para pegar um livro emprestado. Algo raramente permitido pelo colecionador. “Como biblioteca privada, a do Lessa foi a maior que eu já vi”.

BIBLIOTECA
Legado de uma vida inteira de estudos, a biblioteca tem um imóvel só para ela. Ninguém morava lá. São dois andares de uma casa no Cosme Velho. Armários e estantes de madeira ocupam todo o espaço e vão até o teto. “E o pé direito é altíssimo. Você só chega nas últimas prateleiras de escada”, descreve Rodrigo. As obras, em sua maioria, estão encadernadas.
O lugar foi organizado no início dos anos 90 para acomodar tudo que Lessa acumulava. Uma parte veio de herança do pai, Clado Lessa, e do tio, Djalma Pinto Ribeiro. Ambos intelectuais já respeitados em seu tempo. O restante surge do insaciável apetite do ex-reitor pela leitura. “Em forma, ele lia praticamente um livro por dia. Ele lia numa velocidade estonteante”, afirma o filho.
O professor emérito do Instituto de Economia vivia em sebos e livrarias, garimpando obras para sua coleção. “Ele se esbaldava em Buenos Aires, uma cidade com muitas livrarias, quando estava na Argentina”, recorda Rodrigo.
“É uma biblioteca de humanas. O grosso da biblioteca eu diria que é história do Brasil. Cinquenta por cento ou mais trata desse tipo de assunto”, acrescenta. “Dentro de Brasil, há duas regiões que ele estudou com maior profundidade, que foram Rio de Janeiro e Minas Gerais”. Uma parte das obras traz a dedicatória do autor para Carlos Lessa.
Mas há de tudo: política, antropologia, sociologia, filosofia, literatura brasileira, entre muitos outros temas — ainda em vida, Lessa doou o que tinha de economia para o Instituto onde trabalhou, na UFRJ. Algumas relíquias merecem destaque: uma primeira edição de Os Lusíadas, feita pela Casa de Leitura do Real Gabinete Português de Leitura e um livro do fotógrafo Marc Ferrez.

FAMÍLIA QUER TRANSCREVER PALESTRAS

Rodrigo alimenta três grandes projetos em relação à memória do pai. O primeiro é editar algumas obras dele. Em segundo lugar, quer reunir, em um grande livro, todos os artigos que Lessa produziu. “Ele escreveu sobre muita coisa: desde shopping, modernidade, urbanismo, festas brasileiras até pós-modernidade”. O terceiro, mais ambicioso, é conseguir as gravações de conferências e palestras ministradas e, em seguida, transcrever e editar o material para outro livro. “Eu penso que está ali o filé do pensamento do meu pai. As aulas dele eram verdadeiras pinturas”, explica. “Claro que, quando ele fazia um livro, sabia como apresentar o núcleo da ideia. Mas, na palestra, soltava as erudições, os cacos, as piadas. Ele gostava mais de falar do que de escrever”.

bandeira adufrjDiretoria da AdUFRJ

Há apenas cinco meses, no dia 7 de agosto de 2020, nosso jornal prestava uma homenagem à memória dos 100 mil mortos oficiais, vítimas da covid-19, e se solidarizava com as famílias e os amigos dos que partiram. Iniciamos o ano de 2021 com a tenebrosa marca de 200 mil óbitos notificados. Dobramos o número, e não há por parte desse desgoverno qualquer gesto de solidariedade às centenas de milhares de pessoas que perderam seus entes queridos. Ao contrário, permanece o escárnio, o menosprezo pelas vidas já perdidas e por aquelas mortes que irão acontecer, sem que se vislumbre nenhuma ação consistente por parte do Ministério da Saúde.
Em relação às universidades públicas, o mesmo desrespeito e impulso destrutivo. A última escolha da lista tríplice para reitor da UFPel demonstra de forma inequívoca que o projeto é mesmo: desmoralizar, desorganizar e desorientar as instituições universitárias brasileiras. A escolhida pelo presidente, a professora Isabela Fernandes, é a segunda colocada da lista, com apenas seis votos. Entretanto, não se trata de uma aliada bolsonarista em busca de notoriedade e poder. Ela é parte da equipe do professor Paulo Ferreira, integrou sua chapa e integraria sua equipe. Logo, a natureza do gesto é tão somente desafiar a comunidade universitária, desqualificar sua escolha, desagregar a instituição, dificultar a gestão. Enfim, seu objetivo é apenas o de trazer problemas, destruir o que está feito e atrapalhar a vida das pessoas.
Apesar do quadro terrivelmente adverso, nós seguimos resistindo e produzindo. E foi essa a escolha para a capa de nosso jornal. Vamos ocupá-la com a vida, com a produção de conhecimento, com iniciativas e propostas importantes para a sociedade. É hora de recarregarmos a bateria, renovarmos as esperanças e acreditarmos em nossa força e capacidade de mobilização.
O ano mal começou e já deu mostras de que não será simples atravessá-lo. A eleição do pastor Raphael Warnock para o Senado norte-americano pelo estado da Geórgia foi um fato histórico, digno de uma grande comemoração. Não só por ser democrata, mas porque pôs em campo um eleitorado negro que estava afastado da política. Só que não nos deixaram comemorar por muito tempo. As cenas grotescas da invasão de supremacistas no Congresso imediatamente ocuparam as manchetes e noticiários de todo o mundo. Um espetáculo de horror, mas quase risível, onde vale aquela velha expressão: seria cômico se não fosse trágico. Nos próximos dias, vamos poder avaliar melhor a extensão do movimento e os passos que serão dados em relação a Trump. Trata-se de uma jogada importante para o nosso tabuleiro político. O inepto que ocupa a Presidência da República no Brasil já aproveitou para bater na tecla da fraude da eleição eletrônica, tentando armar a cama dele por aqui, seguindo os passos do líder.
Apesar de estar em crescente isolamento, Bolsonaro não é carta fora do baralho e ele nunca escondeu seus delírios autoritários. É tarefa urgente derrotá-lo em todas as frentes. Como já tentamos demonstrar no início desse texto, não se trata de disputar um projeto, ou de derrotar uma proposta de governo de extrema-direita. Trata-se de um não-governo, cujo único projeto parece ser o de destruir todas as redes de proteção ao cidadão, ao meio-ambiente, à vida. Não podemos nos abater com o tamanho do problema, nem nos iludirmos de que teremos uma grande vitória. A hora é simplesmente de cumprir a tarefa que nosso tempo nos legou: vamos lutar dia e noite, de forma incansável, pela derrota de Bolsonaro. Não porque este seja o nosso inimigo eleitoral, mas porque com ele não estamos apenas à deriva, mas sim sendo conduzidos aos rochedos, para que naufraguemos como nação.
Que venha 2021 com seus desafios! Será melhor que 2020, porque ao menos agora já sabemos o que nos espera e aprendemos um pouco a lidar com tudo isso. Teremos a vacina, temos propostas para que ela chegue a todos, estamos vivos e estaremos na luta!

Mosquito palha 300x198Mosquito-palha, vetor transmissor - Imagem: divulgação

A covid-19 é uma enfermidade nova que desafia milhares de pesquisadores — e atrai milhões de dólares — de todo o planeta.
Mas, apesar da tragédia sanitária imposta pelo coronavírus, há outras centenas de doenças que castigam os países em desenvolvimento e que não atraem tantos recursos. São as chamadas doenças negligenciadas. Casos da malária, da doença de Chagas, da leishmaniose. São patologias cujo tratamento depende essencialmente das universidades públicas e de seus dedicados cientistas. Os da UFRJ não fogem à luta. Um exemplo vem dos estudos sobre leishmaniose.
Pesquisadores da UFRJ acabam de publicar o resultado de um estudo — único no mundo — que associa células-tronco de tecido adiposo à terapia medicamentosa tradicional para leishmaniose.
“A leishmaniose é uma imunopatologia. Ela se desenvolve pela picada do mosquito, que inocula o parasita, mas também pela resposta do sistema de defesa do organismo”, explica Herbert Guedes, coordenador do trabalho. “As células-tronco suprimem as respostas imunológicas ‘ruins’ e com isso reduzem o processo inflamatório”, conta o docente.
Ao longo dos experimentos, feitos tanto com células-tronco da medula óssea, quanto com células-tronco do tecido adiposo, os cientistas observaram que aquelas provenientes do tecido de gordura geravam melhores resultados, reduzindo significativamente as lesões provocadas na pele. Mas ainda não eram capazes de reduzir a carga parasitária. “Então tivemos a ideia de associar as duas terapias e observar como os camundongos se comportavam”, conta o professor. “Eles começaram a voltar ao estágio anterior à contaminação”, revela Guedes.
Além do professor Herbert Guedes, a pesquisa envolve outros quatro docentes da universidade e o doutorando Tadeu Ramos, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho.
WhatsApp Image 2020 12 18 at 10.52.28 1Considerada endêmica em 85 países, incluindo o nosso, a leishmaniose mata de 20 a 40 mil pessoas anualmente no mundo. Há 1,5 milhão de novos casos todos os anos. Mais de um bilhão de pessoas correm risco mais iminente de infecção. A transmissão se dá pela picada do flebotomíneo conhecido como “mosquito-palha”
Os pesquisadores utilizaram a leishmania amazonensis, um dos tipos encontrados no Brasil e que causa feridas por todo o corpo, para os experimentos. E pretendem em breve iniciar novos estudos, desta vez com a leishmania braziliensis, causadora de lesões irreversíveis nas mucosas da boca e nariz. “Depois de realizar essa etapa, nosso objetivo é iniciar os estudos clínicos”, revela o coordenador do estudo.
Mais eficaz e menos tóxica
A pesquisa é uma tentativa de dar novas possibilidades aos doentes, com terapias menos agressivas. “Os tratamentos tradicionais foram desenvolvidos na década de 1940 e são muito tóxicos. Podem causar graves sequelas para coração, rins e fígado, além do risco de induzir ao diabetes”, explica Tadeu Ramos, primeiro autor do artigo publicado na revista Stem Cell Research & Therapy. “São 20 dias de injeções intramusculares. Em alguns lugares, como na Índia, já há cepas resistentes aos tratamentos”, observa o pesquisador.
Em vez dos 20 dias, como é a praxe da terapia convencional, os pesquisadores fizeram aplicações ao longo de 32 dias, por dias alternados. Além de duas aplicações de células-tronco com intervalos de 7 dias entre elas. “Os camundongos com este tratamento combinado tiveram suas lesões curadas antes que as lesões dos outros animais dos grupos de controle chegassem ao tamanho máximo, além da redução drástica da carga parasitária”, revela Tadeu. “Aponta para a diminuição da toxicidade do tratamento, já que conseguimos diminuir as doses do remédio, além de aumentar a velocidade do restabelecimento da pele”, comemora o doutorando.
Especialista em células-tronco, a professora Fernanda Cruz, do Instituto de Biofísica, também assina o trabalho. “Antigamente a gente pensava que a célula-tronco podia ser utilizada só por sua capacidade de se diferenciar. Mas descobrimos ao longo dos estudos que ela possui propriedades antiinflamatórias, microbicidas, de regeneração de tecido sem deixar cicatrizes”, elenca a docente. “Ela pode ser aplicada para tratamento de diversas doenças, desde as crônicas, ligadas ao envelhecimento, até as infecciosas”, afirma a pesquisadora.
As células utilizadas no estudo foram do tipo mesenquimais, encontradas na medula, no tecido adiposo, no cordão umbilical, na placenta e até no sangue menstrual. O tratamento, porém, ainda é caro. “Tudo isso seria barateado se nosso país investisse em produção interna de biomateriais e insumos para pesquisa. Seria uma boa estratégia para tornar tratamentos como esse mais popularizados”, avalia Fernanda.
Tadeu Ramos chama atenção também para as facilidades que envolvem o uso de células do tecido adiposo. Elas podem ser retiradas do próprio paciente, de maneira mais simples se comparada a uma punção na medula óssea. Além de poderem ser extraídas a partir de gordura retirada de procedimentos estéticos, como lipoaspiração. “É um projeto que pode efetivamente mudar a vida das pessoas. Propor um tratamento alternativo a alguém que está sofrendo é muito gratificante”, finaliza.
O orientador de Tadeu, professor Herbert Guedes, lembra que o sofrimento provocado pelas doenças negligenciadas pelos grandes laboratórios só pode ser amenizado com fortes investimentos nas universidades públicas em países em desenvolvimento. “Infelizmente são patologias que não têm aporte das grandes farmacêuticas porque não são presentes no primeiro mundo”, lamenta o professor Herbert. Trocando em miúdos, se não atinge os países ricos e nem representa risco de colapso para a economia, não há interesse na erradicação da doença. Mas não é só isso. “Depende também de vontade política e interesse dos governos locais, com fortes investimentos financeiros em pesquisas”, completa o docente. “Infelizmente, isto também não é comum”, afirma.

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