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WEBPROFESSORProfessor Eduardo CoelhoNomeada presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa por indicação do deputado federal e pastor Marco Feliciano, Letícia Dornelles é repórter, autora de livros, telenovelas e roteiros de programas de humor, como Partiu shopping. Em entrevista concedida ao jornalista Bernardo Mello Franco no dia 27 de outubro, publicada n’O Globo, Letícia Dornelles afirmou que pretende “humanizar” a instituição, torná-la aconchegante por tratar-se de um “lar”, “acelerar as palestras, que hoje são muito acadêmicas”, entre outras barbaridades que evidenciam, no mínimo, que a nova presidente desconhece a complexidade e a importância dessa fundação.
Criada há quase um século, a Casa de Rui Barbosa compreende um museu, arquivos e bibliotecas, além de pesquisas nas áreas de arquitetura, arquivologia, belas artes, biblioteconomia, direito, história, filologia e políticas culturais. Com uma equipe altamente habilitada em todas as suas áreas de atuação, há décadas a Casa de Rui Barbosa é uma das instituições federais mais respeitadas do país, tanto pelo seu trabalho de conservação e preservação da memória, quanto pelos seus resultados de pesquisa, que consistem em colaborações imprescindíveis a diversos setores. A manutenção desse perfil de excelência a que a Fundação Casa de Rui Barbosa está associada se encontra, agora, sob forte ameaça.
Afinal de contas, na referida entrevista, o vocabulário e as imagens a que Letícia Dornelles recorreu manifestam uma concepção equivocada da coisa pública, que não à toa ela tratou a partir de um princípio relacionado à família (“lar”), sobrepondo a necessidade de afeto (“dar um grande abraço naquela casa”) a um plano estratégico de trabalho. Ao mencionar o escritor Carlos Drummond de Andrade, não fez quaisquer observações acerca da grandeza de sua obra como testemunho da experiência humana, mas apenas ao fato de ter sido sua vizinha: “É afeto mesmo, sabe?”, completou. Por outro lado, num sentido contrário às práticas acadêmicas, se torna perceptível em seu vocabulário a incorporação de uma lógica da indústria cultural, tendo o objetivo de “acelerar” as palestras.
A Fundação Casa de Rui Barbosa não se trata de um “lar”, mas de uma instituição pública, que requer gestores competentes e habilitados, o que, por sinal, pode ser facilmente reconhecido em sua história, que reúne figuras inclusive conservadoras, como Américo Jacobina Lacombe. No entanto, ao contrário de Letícia Dornelles, o ex-presidente Lacombe reuniu uma equipe habilitada, que entre outras iniciativas participou da criação do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, onde estão concentrados alguns dos mais relevantes arquivos pessoais e coleções de escritores brasileiros, como Carlos Drummond, Clarice Lispector, Cruz e Sousa, João Cabral de Melo Neto, José de Alencar, Machado de Assis, Manuel Bandeira, Vinicius de Moraes, entre muitos outros.
Por meio da nomeação de Letícia Dornelles para a presidência da Fundação Casa de Rui Barbosa, observamos não apenas o aparelhamento ideológico que o governo federal empreende desde o início deste ano, igualmente observado na condução da Funarte, por exemplo, mas também sua intenção de desmantelar o que há de consistente no plano da cultura, do ensino e da pesquisa no país.

Eduardo Coelho
Professor da Faculdade de Letras/UFRJ e ex-chefe do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa

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