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WhatsApp Image 2025 10 01 at 18.14.57Durante a pandemia de covid-19, Amilcar Tanuri se tornou um dos principais nomes do país a desvendar os segredos do novo vírus. Seu laboratório passou a realizar testagens moleculares padrão ouro para hospitais de todo o Rio de Janeiro. Por pelo menos três meses, de março a junho, só a UFRJ era capaz de realizar esse tipo de teste no estado do Rio, graças à expertise do pesquisador.
“As universidades vêm mostrando a sua importância dentro desse tópico de doenças emergentes e reemergentes. Não foi só a covid-19. Teve a zika, em 2015, e a monkeypox, recentemente. Cada vez mais o mundo vai estar exposto a esse tipo de doenças, e ter uma universidade e cientistas que possam dar uma resposta rápida é fundamental”, declarou o pesquisador, em 2022, em uma das muitas entrevistas que gentilmente concedeu ao Jornal da AdUFRJ.
Além do laboratório que coordenava, Tanuri fundou o Departamento de Genética, na Biologia e, mais recentemente, com a professora Terezinha Castiñeiras, criou o Núcleo de Enfrentamento e Estudos de Doenças Infecciosas Emergentes e Reemergentes (Needier). Também foi importante articulador do processo de interiorização da UFRJ, ao criar o Laboratório de Doenças Emergentes e Negligenciadas (LIDEN) no NUPEM-Macaé. “Ele foi muito importante para muita gente. Mesmo assim, era tão simples. Estou devastado”, revelou o professor Rodrigo Nunes da Fonseca, da diretoria da AdUFRJ e grande colaborador de Tanuri.
Seus estudos permitiram mais segurança a doadores e receptores de sangue. “Sua contribuição foi essencial para a implementação do teste molecular para assegurar a proteção nas transfusões de sangue quanto à transmissão de vírus como HIV e hepatites B e C”, afirmou a ex-ministra da Saúde e pesquisadora da Fiocruz, Nísia Trindade. “Esse é um legado essencial para a segurança da hemorede”.
Amilcar Tanuri foi o primeiro servidor da UFRJ a receber a vacina da covid-19. “Mesmo correndo risco, sendo imunodeprimido e paciente oncológico, ele seguia na linha de frente durante a pandemia. Não deixava o laboratório. Por isso, foi escolhido como primeiro servidor a receber a vacina na UFRJ”, relembra a professora Denise Pires, reitora à época. “Ele era referência para todos nós, um exemplo”.
Em março deste ano, o docente lançou o livro “Pandemia de covid-19 no Brasil: A visão de um cientista”. O evento aconteceu no Fórum de Ciência e Cultura. Durante sua conferência, o docente afirmou que o vírus SARS-Cov2 sempre esteve um passo à frente da ciência. E fez uma provocação: “Será que na próxima pandemia isso vai se repetir?”. A pergunta infelizmente não será mais respondida por ele, mas pelos cientistas que seguirem seu legado.
O professor faleceu por complicações no coração. Deixou a esposa Andréa, os filhos Luiza e João e o neto Francisco. “Está sendo muito difícil lidar com a perda. Sinto um vazio absoluto. Meu doce companheiro e amigo... Tenho certeza que fará muita falta para todos que puderam conhecê-lo”, conclui Andréa.

Prezadas e prezados,

Convidamos para a Assembleia Geral da Adufrj-SSind, quando será realizada a cerimônia de posse da diretoria e do conselho de representantes da entidade para o biênio 2025-2027. O evento acontecerá no dia 15 de outubro de 2025, quarta-feira, às 18h, no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, Av. Rui Barbosa, 762.

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WhatsApp Image 2025 09 24 at 20.16.55 8Fotos: Fernando SouzaRecém-iniciada, a primavera ganhou um colorido diferente na UFRJ. Desde segunda-feira, professores, alunos e técnicos apresentam uma parte da fina flor do ensino, pesquisa e extensão produzidos na universidade. É a 14ª Semana de Integração Acadêmica (SIAC) — a maior dos últimos anos, com 6.615 trabalhos (veja infográfico AQUI) — ocupando salas e corredores em todos os campi.
E uma festa do conhecimento deste porte não poderia ter um começo melhor: em grande evidência na mídia nacional com a revolucionária pesquisa sobre o tratamento de lesões medulares, a professora Tatiana Sampaio realizou a conferência de abertura. “Não posso nem descrever a honra que é ter sido convidada a falar na abertura deste evento tão importante que é a SIAC”, disse a docente do Instituto de Ciências Biomédicas.
No lotado salão nobre do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza, Tatiana mostrou as idas e vindas de um projeto que nasceu em 1999 na bancada do laboratório — como muitas iniciativas da SIAC —, virou estudo clínico em humanos em 2018 e, após longos 25 anos, está cada vez mais perto de se tornar um medicamento comercializado no mercado: a polilaminina.
Poli o quê? “Só para falar já é difícil. É um trava-língua. Mas a culpa não é minha. Foi um editor de revista científica que deu o nome. Para editor, a gente fala ‘sim, senhor’. Se vocês tiverem alguma ideia de como encurtar isso, me mandem”, brincou Tatiana logo no início da apresentação, arrancando risadas da plateia.
A polilaminina é uma “malha” inventada a partir de proteínas naturais, as lamininas, presentes em várias partes do corpo e com alto poder regenerativo no sistema nervoso periférico. “Quem fez uma cirurgia, uma cesariana, perde a sensibilidade no local, porque cortou um nervo, mas a sensibilidade volta após um tempo”, explicou Tatiana.
O estudo coordenado pela docente potencializou esse efeito para a medula espinhal, onde a laminina deixa de existir poucos dias após as pessoas nascerem. E, entre 2018 e 2021, chegou a um estudo experimental com seres humanos. Os pacientes receberam injeções de polilaminina até três dias após as lesões sofridas em acidentes ou ataques por arma de fogo. Dois deles morreram por condições não ligadas ao tratamento e seis recuperaram movimentos que haviam perdido, em diferentes graus.
Em linguagem didática e descontraída ao mesmo tempo, Tatiana mostrou como a investigação científica depende de muita colaboração para sair do papel. “Que tal organizar um estudo clínico para pacientes humanos com lesão medular completa nas emergências dos hospitais públicos do Rio e injetar uma droga completamente nova na medula espinhal deles, com pouco financiamento público?”, brincou. “Tive muita ajuda de muitas pessoas que embarcaram nessa ‘furada’, a princípio, e ajudaram a tornar a pesquisa uma realidade”, disse.
Uma dessas ajudas tornou possível a cooperação do setor produtivo, algo que representa um certo tabu nas universidades públicas brasileiras. Amigos que tinham contato com uma empresa farmacêutica de São Paulo fizeram o “meio-campo” entre Tatiana e o presidente da Cristália. As conversas avançaram para um contrato assinado em 2021 com a UFRJ. “A Cristália é brasileira. Eu tenho muito orgulho da UFRJ, mas também muito orgulho de cooperar com essa empresa. Os anestésicos do SUS são produzidos pela Cristália. Por isso não teve gente morrendo durante a pandemia sem anestésico para poder intubar”, informou.
Hoje, a polilaminina aguarda a aprovação de um estudo regulatório em humanos — que será conduzido na USP — para poder chegar ao mercado. E, em paralelo, já avança uma pesquisa em animais para investigação dos efeitos da polilamina em lesões crônicas, ou seja, que já aconteceram há mais tempo.
Humilde, a professora atribuiu o sucesso midiático da pesquisa ao momento atual do país, que defende a soberania dos ataques do presidente norte-americano. “Depois que apareceu no Fantástico, outros meios de comunicação se interessaram. Virou um boom. Veio ao encontro de um momento do país de a gente poder dizer que somos independentes, que podemos fazer nossas coisas”, disse. Mas não teve jeito. A pesquisadora foi aplaudida de pé pelo público e a SIAC ganhou uma abertura histórica.
Pró-reitor de pós-graduação e pesquisa, o professor João Torres arrematou: “Dou aula de história da ciência. E às vezes pergunto aos meus alunos quais são as fotos mais impressionantes da Ciência. Citam as fotos do Atol do Bikini, no Pacífico, onde foram realizadas as primeiras experiências da bomba atômica. Citam as fotos do hospital do Canadá, com crianças diabéticas tomando insulina pela primeira vez. Quem sabe daqui a alguns anos a foto citada será dos pacientes da Tatiana levantando das cadeiras?”, questionou.

“ENFRENTEM PROBLEMAS CONCRETOS COM IMAGINAÇÃO E MÉTODO”

WhatsApp Image 2025 09 24 at 20.16.55A 14ª SIAC cresceu em relação ao ano anterior: são 6.615 trabalhos e 15.125 participantes inscritos contra 6.404 e 14.119, respectivamente, de 2024 (veja os números na página 5).
“Os números são surpreendentes. E destes mais de 6 mil trabalhos, 907 se apresentam dentro da modalidade de ensino, pesquisa e extensão, já integrados. Essa é uma tendência crescente. Temos trabalhado para que esta integração se dê de forma recorrente nas três dimensões”, disse a pró-reitora de Extensão, professora Ivana Bentes, durante a mesa de abertura do evento.
O pró-reitor de Pós-graduação e Pesquisa, professor João Torres, considera a SIAC o grande momento do calendário acadêmico. “Para mim, o momento mais especial do calendário da UFRJ é a Semana de Integração Acadêmica — e, em particular, as apresentações do PIBIC. É aqui que a universidade, apesar das adversidades, floresce à vista de todos, com a criatividade, o rigor e a generosidade que caracterizam o nosso fazer universitário”.
João Torres avaliou o evento como uma oportunidade para o diálogo entre diferentes áreas. “Procurem colaborações improváveis, misturem linguagens, compartilhem dados e ideias, enfrentem problemas concretos com imaginação e método. A universidade pública se afirma quando transforma excelência em propósito, rigor em serviço, conhecimento em bem comum”, completou.
Já a pró-reitora de Graduação, professora Maria Fernanda Quintela, fez um apelo para que a SIAC cresça ainda mais. “Venho pedir um envolvimento maior. A SIAC são cinco dias letivos. Essa semana tem que ser valorizada. Nós temos que parar nossas aulas, não posso ter professor dando prova hoje”, disse.
O reitor Roberto Medronho situou a realização da SIAC no debate atual em torno da soberania do país. “Hoje se discute muito a questão da soberania. Soberania depende de ciência, tecnologia e inovação. Precisa de educação. Nós precisamos produzir nosso próprio conhecimento. Não podemos mais ficar dependentes de nenhum outro país”.

Com profunda dor e pesar, a AdUFRJ comunica o falecimento do professor Amilcar Tanuri na sexta-feira, 26 de setembro, aos 67 anos. O virologista era chefe do Laboratório de Virologia Molecular e professor Titular do Instituto de Biologia da UFRJ. Ele deixa orfã uma legião de alunos, amigos e colegas.
"Amilcar era um exemplo de dedicação e inteligência, inspirando várias gerações de pesquisadores e criando um grande laboratório de genética viral no Departamento de Genética da UFRJ. Era também pessoa com ótimo senso de humor, coisa tão importante em nossos ambientes muitas vezes tão estressantes", resume com tristeza o 2º vice-presidente da AdUFRJ, professor Antonio Solé, colega de Tanuri no IB. "Fará muita falta, mas permanece o seu enorme legado para a UFRJ e para o mundo", conclui.
Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e membro titular da Academia Brasileira de Ciências, Amilcar Tanuri era pesquisador associado da Universidade Columbia (EUA) e coordenador das Ciências Biológicas da Faperj. Ele foi o primeiro servidor da UFRJ a receber a vacina da covid-19 e buscava, em seu laboratório, entender o funcionamento do vírus causador da doença. Também era mundialmente reconhecido por suas pesquisas na área de HIV e zika.
O docente também foi importante articulador do processo de interiorização da UFRJ ao criar o Laboratório de Doenças Emergentes e Negligenciadas (LIDEN) no NUPEM-Macaé. "Ele foi muito importante para muita gente. Mesmo assim, era tão simples. Estou devastado", revela o professor Rodrigo Nunes da Fonseca, também da diretoria da AdUFRJ e grande colaborador de Tanuri.
A AdUFRJ lamenta a perda. A UFRJ, o Brasil e a Ciência ficam mais pobres hoje. Desejamos forças aos amigos e familiares.
 
Na foto: Amilcar Tanuri recebe o imunizante da covid-19 na UFRJ, em janeiro de 2021. Crédito: Alessandro Costa/AdUFRJ

Carioca da gema e flamenguista convicto, o professor Luiz Davidovich é uma das sumidades da UFRJ. Professor emérito e especialista em óptica quântica – ramo da física que investiga a interação da luz com a matéria –, ele foi anunciado como grande vencedor do prêmio TWAS Apex 2025. A honraria, uma das maiores do mundo, é dedicada a pesquisadores de países em desenvolvimento. No caso de Davidovich, o prêmio foi concedido por suas pesquisas na área da ciência quântica.

WhatsApp Image 2025 09 24 at 20.16.56 2Foto: FERNADO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASILA brilhante carreira do professor Luiz Davidovich, de quase 50 anos de dedicação ao ensino e à pesquisa, foi inspirada dentro de casa, no Flamengo. Sua mãe, a geógrafa Fany Rachel Davidovich, foi pioneira no Brasil nas pesquisas em Geografia Urbana. “Minha mãe trabalhava no IBGE e desenvolveu uma pesquisa pioneira. A Geografia Urbana inovou muito. Ninguém fazia aquilo. Era muito mais completa, analisava muito mais variáveis e estendeu o próprio conceito da Geografia”, lembra o professor.
“Além de minha mãe ser profundamente ligada à pesquisa, o meu pai (Paschoal Davidovich) também foi fundamental nessa minha formação. Ele era engenheiro civil, mas tinha uma vasta biblioteca de História e Filosofia. Era fantástica e eu passava horas ali”, recorda.
Quando estava na antiga sétima série do ginásio (hoje oitavo ano), o curioso Luiz se inscreveu num curso por correspondência do Instituto Monitor. O objetivo, ao final, era montar um rádio em casa. “As correntes elétricas, hidráulicas, as trocas de elétrons... tudo isso me despertou mais curiosidade na área de Física”, conta.
Quando chegou a época do vestibular, Luiz Davidovich passou para engenharia na UFRJ – o curso ainda funcionava no Largo de São Francisco de Paula, no Centro – e para Física, na PUC-Rio. “Pensei em fazer os dois cursos ao mesmo tempo. O de Física começou primeiro. Lá eu tive um professor, Pierre Henri Lucie, que tinha uma maneira tão dinâmica de ensinar, que me cativou”, lembra. “Em duas semanas fiquei decidido a seguir na Física”.
Bolsista de produtividade 1A do CNPq, Davidovich tem mais de cem artigos indexados em periódicos de alto prestígio, 21 capítulos de livros e 36 orientações de mestrado e doutorado no currículo. O docente integra as Academias Europeia, Chinesa, Brasileira e Mundial de Ciências. Foi presidente da ABC de 2016 a 2022.
A carreira recheada de prêmios, no entanto, quase não pôde ser trilhada. Davidovich formou-se como físico em 1968, ano do endurecimento da ditadura militar no Brasil. “Fui atingido pelo AI-5”, recorda. “Estava no mestrado há seis meses e fui expulso sem direito a ingressar em outra universidade no país”, revela. “Foi uma perversidade, Eu era um bom aluno, mas fui considerado pela ditadura como subversivo”. Ele conta um pouco mais dessa história em entrevista na página 7.
No Instituto de Física, sua “casa” desde 1994 como professor Titular, o docente é uma unanimidade. “Como colega de instituição, é uma alegria imensa celebrar o professor Luiz Davidovich pelo Prêmio TWAS APEX 2025. No Instituto de Física, o Luiz é mais do que um pesquisador de excelência: é um verdadeiro ‘role model’”, afirma João Torres, professor Titular do IF e pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa. “Sua obra científica fala por si, mas o que mais impressiona no cotidiano é o professor dedicado e inspirador — aquele que entra em sala, acende a curiosidade e nos lembra por que escolhemos a universidade pública como projeto de vida”, elogia o docente.
Torres destaca em Davidovich uma característica singular. “O Luiz, junto com outros professores eméritos, ajuda a sustentar um clima institucional saudável e respeitoso. É presença firme e conciliadora nas horas difíceis; alguém que media, escuta e aponta caminhos. Em tempos de pressa e polarização, isso é liderança rara”, afirma.
O pró-reitor também destaca a enorme relevância do colega para o país. “A atuação na ABC, a defesa da ciência, a capacidade de articular comunidades e pautas estratégicas, e a projeção internacional que honra a UFRJ”, resume. “O reconhecimento da TWAS não é apenas um prêmio individual — é um sinal de que o melhor da nossa universidade pode ter alcance mundial quando se combina competência, compromisso e espírito público”.
Se arranca elogios de veteranos colegas, Luiz Davidovich também inspira os professores mais jovens. Egresso da UFRJ e professor do IF desde 2011, Carlos Zarro é só elogios. “Como calouro, já sabia que ele era um expoente e o via muito acessível. Depois, fui seu aluno num curso de informação quântica, já em 2006, e me marcaram sua gentileza, profundidade e humildade”, relata o professor. “Isso me motivou muito. Ele já era um expoente mundial em sua área, mas seguia extremamente humilde e generoso”, elogia. “Depois, como seu colega, seguiu muito forte a minha percepção de sua gentileza e humildade. A grande lição que ele nos dá é que não precisa viver numa torre de marfim para ser um expoente”.

ENTREVISTA I LUIZ DAVIDOVICH, Professor Emérito da UFRJ

‘A pesquisa é para iluminar’

Jornal da AdUFRJ - Como foi viver como estudante o período da ditadura militar?
Luiz Davidovich -
Fui atingido pelo AI-5. Foi uma perversidade. Eu estava no mestrado há seis meses quando fui expulso da universidade, sem direito a me matricular em outra instituição no país. Eu era um bom aluno e fui considerado subversivo. Meus professores, vendo aquilo, entraram em contato com outros brasileiros fora do país, me recomendaram, e eu fui aceito em várias universidades.

Então o senhor
resolveu ir para os EUA?

O diretor da Física da PUC era um padre jesuíta norte-americano. Ele entrou em contato com a Embaixada dos Estados Unidos. A embaixada, que tinha apoiado o golpe, estava naquele momento contra o governo. Então, me chamaram no Consulado do Rio. Eles me deram o visto de um dia para o outro e me recomendaram a sair do Brasil naquela semana. Então, eu fui embora. Na semana seguinte, a ditadura foi me procurar na minha casa.

Perdeu
algum colega?

Sim. Eu felizmente não tive a minha trajetória interrompida, mas muitos colegas tiveram. Alguns foram torturados. Um deles faleceu na Base Aérea do Galeão. Por tudo isso, me imbuí da ideia que pode ser resumida na frase: ditadura nunca mais!

Quando o senhor
voltou para o Brasil foi
para ser professor?

Fiz o doutorado nos Estados Unidos, depois fui para a Suíça. Voltei para o Brasil em 1977 com o convite para integrar o corpo docente da PUC-Rio.

E como foi
o ingresso na UFRJ?

Fomos um grupo de mais ou menos uns 10 professores para o IF, nos anos 1990. O reitor da época era o professor Nelson Maculan. Lá formamos o grupo de física quântica e outros grupos também se estabeleceram. O diretor do instituto, na época, era o professor Fernando Souza Barros, que foi muito importante para o nosso acolhimento.

No mundo polarizado de hoje, qual o papel da ciência?
A ciência tem poder de quebrar muros, de superar fronteiras, furar as barreiras do preconceito. Nesse sentido, a cooperação internacional tem papel cada vez mais decisivo.

E hoje quais são os principais desafios para a cooperação científica internacional?
Hoje temos um grave problema: estão sendo limitados para exportação equipamentos e peças considerados sensíveis, que podem ter aplicações para fins militares, por exemplo. Isso está limitando o desenvolvimento científico. Os EUA disseram, por exemplo, que a cooperação com a física quântica só poderia ser realizada com países parceiros nesse ramo. Não há nenhum país parceiro dos EUA na América Latina. Isso significa que não poderemos importar dos EUA equipamentos e peças ligados à física quântica. Isso é um atraso de vida. As limitações atuais são muito preocupantes para a ciência.

Qual seria o caminho?
O Brasil precisa produzir sua própria tecnologia. Fazer inovação movida à proibição. Isso já aconteceu em outros momentos. Temos enriquecimento de urânio para permitir o funcionamento de nossas usinas, fruto da proibição da importação de urânio enriquecido. Temos uma excelente fábrica de fibra de carbono porque não era permitido importar esse material. A fibra tem aplicação também em mísseis. Ou seja: precisamos investir mais em ciência, tecnologia e inovação. O investimento em CT&I precisa vir acompanhado de justiça social. Temos grandes vocações em muitas áreas, são possibilidades fantásticas.

Num cenário muitas vezes de poucos recursos, o que o senhor pode dizer para quem pretende ingressar na pesquisa?
Faça contato com o seu coração, com o que você é. Seja ousado. Nunca transforme a pesquisa em algo burocrático. A pesquisa é para iluminar, para entrar em novos territórios. Não pense no que vai lhe dar mais dinheiro. Seja inovador. Trilhe caminhos que não foram percorridos por você e muitas vezes por ninguém. A emoção de descobrir coisas que ninguém mais sabe, de formar pesquisadores, de lidar com as dúvidas dos estudantes é indescritível. Dedique-se. A ciência exige esforço.

O PRÊMIO

O TWAS Apex 2025 é oferecido pela Academia Mundial de Ciências, fundada pelo Nobel de Física paquistanês Abdus Salam, em 1983. A organização é associada à Unesco e busca promover a ciência em países em desenvolvimento. Luiz Davidovich foi agraciado pelo conjunto de sua obra na área de ciência quântica. Ele será laureado no dia 2 de outubro, no encerramento da 17ª Conferência Geral da Academia Mundial de Ciências, que acontecerá no Rio de Janeiro. Além de uma medalha e certificado, o professor receberá um prêmio em dinheiro no valor de US$ 100 mil. “Fiquei muito emocionado e honrado. É um prêmio muito grande, conferido por uma instituição que prezo muito”, declara Davidovich.

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